São Paulo, sábado, 26 de março de 1994
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Jodie Foster se diverte no velho Oeste

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

Metida mais uma vez num vestido de época, todo espartilho e saias rodadas –"eu estou começando a me acostumar a este estilo", ela ri– Jodie Foster tenta dar cabo de seu almoço, uma gigantesca salada de alface, tomate, cenoura e peito de frango grelhado. Duas coisas conspiram contra ela: o espartilho apertado e o tempo escasso antes que o diretor Richard Donner a chame para o estúdio 11 da Warner, em Burgank, para mais um take de "Maverick".
Inspirado, na série de TV homônima dos anos 50 e 60, o western/comédia foi produzido por seu astro, Mel Gibson, um fã confesso do seriado original que, é claro, escolheu para si o papel do charmoso pistoleiro/jogador. James Garner, criador do "Maverick" original, volta desta vez como um xerife no encalço do trambiqueiro profissional –e Jodie é uma nova personagem, a misteriosa Annabelle, aparentemente tão sedutora quanto perigosa.
Uma surpresa, diz Jodie, com resultados altamente positivos."Maverick" estréia nos Estados Unidos no final de maio e já se fala numa continuação.
*
Folha - Este filme é tanto um western quanto uma comédia. As duas coisas são novidades para você? Você se sente à vontade no gênero?
Jodie Foster - Eu temia que você me perguntasse isso, porque não sei a resposta. Não sei mesmo. Só sei que acho muito mais difícil e tenho aprendido muito com Dick (o diretor Richard Donner), Mel (Gibson) e todo o elenco.
Folha - Então "Maverick" é decididamente uma comédia, no sentido de paródia?
Foster - Mel é uma maravilha como colega de trabalho. É um sonho trabalhar com ele, porque, além de um grande profissional, ele é divertidíssimo. E improvisa muito, coisa que eu adoro. Tem cenas inteiras que nós improvisamos, os dois se segurando para não rir. O meu humor é muito verbal, muito cerebral, muito inglês –e muito safado. Mel é muito safado também, mas ele é mais físico, mais visceral, mais gozador.
Folha - E que tipo de personagem é a sua Annabelle?
Foster - Uma mulher muito interessante, porque ela se passa por uma donzela desprotegida, uma mulher fatal, mas na verdade ela é uma ladra, uma vigarista de primeira categoria, capaz de passar todos os homens para trás.
Folha - Você diria que ela é uma mulher forte, uma exceção nos westerns?
Foster - Nos filmes, sim: o clichê do western é a mocinha desprotegida, não é? Mas não tenho tanta certeza de que era assim na vida real, no velho Oeste. Creio que a vida era muito dura e muito arriscada para atrair mocinhas desprotegidas... Vinte dias numa diligência através das planícies... Essas mulheres deviam ser incrivelmente corajosas, extraordinárias mesmo. Eu nunca acreditei nesse mito da mocinha frágil. Eu estou aqui, eu sou assim, eu ponho minha própria gasolina no meu carro, como posso crer que não existe ninguém como eu na história, no passado? Nunca acreditei nisso.
Folha - Você acha que tem uma responsabilidade, como atriz e cineasta, de demolir mitos como este?
Foster - É uma questão de sensibilidade, acima de tudo. Porque existe um limite para a responsabilidade que uma pessoa sozinha pode ter, especialmente nesta indústria, especialmente se não estou trabalhando como diretora. Um filme é uma expressão de seu diretor e, se você é uma pessoa esperta, você vai querer ler o roteiro com atenção, conversar com o diretor, saber qual o ponto de vista dele. E o ponto de vista dele pode não ser misógino, mas pode ser algo que faça a mentalidade das pessoas retroagir algumas décadas... e isso não me interessa. Eu só consigo trabalhar num filme por ano, como atriz. Eu jamais participaria de um filme com um ponto de vista retrógrado.

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