São Paulo, domingo, 27 de março de 1994
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Nascidos em 31 de março rejeitam política

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

Eles já foram chamados de quase tudo: "Geração AI-5", "Geração Coca-Cola", turba de alienados, filhos da televisão. Nascidos em um período confuso da vida brasileira, são de uma época em que era obrigatório estudar Educação Moral e Cívica nas escolas. Têm hoje em torno de 30 anos e não se parecem em nada com a libertária geração anterior. De um modo geral, afirmam ter pouco ou nenhum interesse pela política, não usufruíram da revolução sexual e dançaram muito em discoteca, inspirados por John Travolta e pela novela "Dancin' Days".
Para falar dessa geração, a Folha entrevistou pessoas nascidas em 31 de março de 1964, dia oficial da eclosão do movimento militar que derrubou o governo João Goulart. São os legítimos "filhos da revolução", como diz uma música de Renato Russo, o líder da banda Legião Urbana.
"A professora de Moral e Cívica falava, nunca esqueci, que o melhor sistema de governo era a eleição indireta", diz o engenheiro Jorge Francisco Orihuela Pastor. "Para a criança, revolução dava uma idéia de guerra, canhão, essas coisas. Minha primeira decepção foi descobrir que a revolução de 64 não foi nenhuma Revolução Francesa", diz o comerciante Marcelo André Aguilar.
Formado em direito na USP, Marcelo lê jornais e está a par de tudo o que acontece em Brasília. "Mas não me interesso por política. Só o mínimo necessário para estar informado e poder conversar. Talvez seja um traço da minha geração", arrisca.
Há traços mais visíveis –como a desconfiança em relação ao casamento. Dois entrevistados falaram abertamente que têm "medo" de casar. "É um passo a se tomar com cuidado. Para fazer besteira, é melhor não fazer", diz o engenheiro Amaury Vasken Emin, filho de pais separados. "Minha geração casa e separa muito fácil", diz Jorge Orihuela Pastor.
Em termos culturais, nos anos 70 nada foi mais marcante para essa geração do que "Os Embalos de Sábado à Noite", estrelado por Travolta, e as matinês, em São Paulo, nas discotecas Papagaio e Saint Paul. "Ia todo fim-de-semana. Era gostoso", lembra Monica Monteiro Miranda.
Sexo e drogas? "A minha geração é mais careta que a anterior. Fomos educados por pessoas que tinham 30, 40 anos em 1968 e eram contra a liberação dos costumes. Essas pessoas nos reprimiram. Acho que o yuppie é resultado do conflito vivido pela minha geração", diz Marcelo Aguilar.
O diagnóstico é compartilhado por um especialista, o historiador Nicolau Sevcenko: "Pode-se supor que talvez o único aprendizado adquirido (por essa geração) tenha sido a herança da auto-repressão".

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