São Paulo, domingo, 27 de março de 1994
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O Sebrae e a partilha da qualidade

JOSÉ AUGUSTO ASSUMPÇÃO BRITO

JOSÉ AUGUSTO ASSUMPÇÃO BRITO
O desafio da qualidade total passa, necessariamente, pela educação
Muito se tem falado sobre modernização de serviços, automação de processos industriais e qualidade total no Brasil. Nas universidades, na administração pública, nas empresas privadas e entre consultores o debate é intenso. Nas grandes cidades, proliferam cursos e seminários sobre estes temas que, tão novos quanto essenciais, precisam ser enfrentados pelo Brasil que trabalha para ocupar posição digna no volátil mapa econômico mundial.
O Sebrae –sinônimo da micro e pequena empresa brasileira– não está à margem desta discussão. Pelo contrário, tem investido muito na difusão destes novos conceitos, que estão mudando a ordem das coisas no mundo inteiro. Através de pesquisas de campo e de opinião, temos trabalhado para acompanhar de perto o desempenho das pequenas empresas e com elas interagir para modernizar métodos e elevar a qualidade de seus processos de produção.
O universo das novas idéias é vasto e rico. Assim como a rede de micros e pequenas empresas. Portanto, precisamos garantir que a informação e o conhecimento cheguem aos cantos mais remotos deste país, se quisermos realmente fazer dele um grande país. Precisamos multiplicar estes conceitos por cada armazém, açougue, padaria, consultório médico, papelaria e pequena indústria de nosso território.
Esta discussão não deve, e sobretudo não pode, ficar restrita aos bancos da academia, aos ministérios de Brasília, aos consultores de empresas multinacionais e aos executivos de grandes grupos privados. Construir este país exige democratizar padrões de excelência.
Iniciativas como a que criamos agora com a Folha –os fascículos de qualidade– fazem parte desta ação firme a que o Sebrae tem procurado se dedicar sem descanso. Nas edições de domingo, os leitores da Folha estão recebendo suplementos –um por domingo– com algumas das vantagens comparativas que hoje determinam quem é quem na economia interna e externa. De mãos dadas com a Folha, o Sebrae está convencido de que dá um largo passo rumo à capacitação deste país. Com qualidade.
Este é um projeto educacional e o é porque temos a noção exata de que o desafio da qualidade total passa, necessariamente, pela educação.
Posto que o Brasil não pode prosseguir sem qualidade, temos que entender que este patamar só será alcançado se o conceito outrora abstrato começar no homem, no funcionário, no trabalhador, no contribuinte, no consumidor. No cidadão.
Qualidade no processo produtivo vem junto com qualidade de vida, qualidade social. Portanto, este ou aquele executivo, a despeito da posição que ocupe no mercado, não alcançará êxito se não trabalhar para elevar de forma generalizada os padrões de qualidade de toda a sociedade. A qualidade não é um bem individual. É um processo coletivo.
Com trabalhadores mal alimentados e deseducados, o Brasil pode sepultar qualquer expectativa de resultado no campo da qualidade. Programa de qualidade que funciona é aquele que considera a realidade, existe para transformá-la, mas, sobretudo, privilegia o homem –a dimensão humana do desenvolvimento.
Para demonstrar o que defendo, vamos recorrer aos resultados de ampla pesquisa feita pelo Sebrae e pelo Instituto de Economia Industrial da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no ano passado.
O estudo indicou que a produtividade e o faturamento entre as indústrias de pequeno porte são bem maiores nas que investem em benefícios e treinamento para seus funcionários, e também nas que aplicam normas técnicas e métodos de organização do trabalho.
O faturamento por trabalhador da pequena indústria que adota o vale-transporte, por exemplo, situa-se próximo à casa dos US$ 26 mil anuais; as empresas que asseguram alimentação aos empregados atingem o patamar de US$ 30 mil; o faturamento por pessoa ocupada da indústria que contrata plano de saúde para os funcionários vai além, para US$ 45 mil; na empresa que garante seguro de vida, o ganho é de aproximadamente US$ 50 mil anuais.
Para qualificar estes números, a pesquisa apurou que as indústrias que não concedem benefícios registram faturamento por trabalhador de apenas US$ 15 mil.
As disparidades também são marcantes entre as indústrias que treinam e as que não treinam funcionários. A pesquisa revelou que o faturamento anual por funcionário das primeiras chega a US$ 40 mil, enquanto que as demais amargam menos de US$ 20 mil.
Supor ser possível alcançar patamares de excelência com operários subnutridos e reféns da ignorância é visão desprovida de realismo e, mais que isto, cruel. As pesquisas comprovam à larga tal verdade.
É esta noção ampla que justifica o esforço do Sebrae embutido na campanha de conscientização sobre a importância social da pequena empresa como fonte de emprego –combustível que move nossa máquina para marchar em 94. "Pequena empresa. Dê força a quem dá emprego", será o nosso slogan. Uma vastíssima campanha social pela qualidade.
Acho oportuno destacar que nosso esforço não é isolado. Hoje, o mundo sabe que crescimento econômico amplo, sustentado, depende necessariamente da pequena empresa. Não por acaso, o Banco Interamericano de Desenvolvimento tomou a pequena empresa como prioridade de sua ação continental.
O BID sabe, a Folha sabe e o Sebrae sabe que competitividade econômica não se alcança apenas com bolsões de desenvolvimento. Qualidade é uma onda poderosa em movimento, que atrai, arrasta, envolve. E que agora, com os suplementos dominicais, chega também aos leitores da Folha.
Temos certeza que iniciativas como esta são forte contribuição da sociedade à formação da cultura da qualidade no Brasil.

JOSÉ AUGUSTO ASSUMPÇÃO BRITO, 50, é presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

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