São Paulo, sábado, 2 de abril de 1994
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Carros e estufas

A decisão do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) de manter por mais quatro meses a alíquota do ICMS sobre veículos em 12%, em troca da promessa de um programa de investimentos da indústria, recoloca em cena o debate sobre as câmaras setoriais. É um debate apaixonado. Há quem as defenda como a vanguarda das relações capital-trabalho. Na outra ponta, há quem as considere um exemplo dos velhos mecanismos de subsídios e de privilégios.
É certamente exagerado eleger a defesa obstinada de favores setoriais, à custa do contribuinte, como o supra-sumo da modernidade industrial. Ao contrário, no mundo todo as novas formas de organização capitalista prescindem cada vez mais da proteção do Estado, seja porque a dinâmica tecnológica é mais ágil do que a regulação burocrática, seja porque há crescentes resistências aos subsídios num momento em que vários Estados enfrentam problemas fiscais.
De outro lado, não há como simplesmente tapar os olhos aos resultados obtidos em 1993 pelo acordo setorial que amparou a indústria automobilística. Boa parte do crescimento industrial registrado concentrou-se nesse setor, pródigo em relações de subcontratação. Ou seja, o estímulo à produção tem no caso a virtude de espraiar-se, multiplicando seus efeitos benéficos.
Ainda assim é preciso cautela. É por exemplo notório que todo o crescimento do setor não foi acompanhado de um aumento proporcional do nível de emprego. Esse fato demonstra, por si só, que as câmaras setoriais não são a panacéia universal, mais ainda num período de verdadeira revolução no mundo do trabalho, na qual novas formas de gestão e novas tecnologias são, todas, poupadoras de mão-de-obra.
A tradição nacional é traduzir política industrial e desenvolvimento por protecionismo e corporativismo. Há decerto engenho e arte na criação de plantas em estufas, mas só se há consciência de que o mundo real jamais caberá numa delas.

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