São Paulo, quarta-feira, 6 de abril de 1994
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Consumidor brasileiro de café merece ser respeitado

DAGMAR OSWALDO CUPAIOLO

O Brasil é o maior produtor de café do mundo, sendo o único país que produz todas as variedades e tipos necessários para formar os diversos "blends" que o consumidor do mundo inteiro aprecia. O Brasil também é o segundo maior mercado consumidor de café do mundo, perdendo somente para os Estados Unidos. Mas todos esses méritos, ou ordens de grandeza, por mais incrível que pareça, não estão valendo nada, para azar dos consumidores brasileiros que não estão conseguindo acompanhar a evolução dos preços nas prateleiras dos supermercados.
O motivo dessa situação incoerente está no fato de o Brasil ter firmado um acordo com os Países Produtores de Café (APPC) para elevar o preço do café cru no mercado internacional –um feito que está obtendo enorme sucesso, o que não deixa de ser altamente saudável também para a nossa lavoura.
Acontece que o governo se esqueceu do mercado interno e do quanto ele seria atingido por este esquema. Afinal, mesmo comprando café plantado no Brasil, a indústria é obrigada a pagar, em dólar, o preço que é cotado, naquele mesmo dia, pelas Bolsas de Nova York e Londres. Ou seja: o café é daqui, mas o preço é de lá. Para se ter uma idéia, em abril de 93, uma saca de 60 kg de café custava 50 URVs. Hoje, a indústria paga por esta mesma saca 80 URVs.
Ora, sendo o grão de café cru o único ingrediente do café torrado e moído, e representando hoje 50% na composiçào do preço de cada quilo de café vendido pela indústria ao varejo, a atual situação só pode levar a dois acontecimentos: a indústria repassar este aumento real (o que vem sendo feito apenas em parte, pois não há como o consumidor absorver), indo contra o plano do governo de conter a inflação; ou o próprio governo procurar regularizar o mercado, através da liberação de parte de seu estoque de café para as indústrias, o que amenizaria em muito o impacto dos preços tanto para as torrefadoras quanto para o consumidor.
Afinal, o governo brasileiro possui 17 milhões de sacas estocadas que, infelizmente, não tem sido aproveitadas para "regular" a situação do produto para o consumidor brasileiro. Ora, se existe um estoque regulador, guardado já há alguns anos, gerando um alto custo para o governo na sua manutenção e armazenagem, por que não usá-lo em benefício do consumidor brasileiro, cujo poder aquisitivo não consegue acompanhar a própria inflação?
Na mesma situação de sufoco vivem as indústrias de café. Não conseguindo passar para o preço final do produto todos os aumentos registrados no café cru e trabalhando com uma defasagem em dólar, da ordem de 13%, ocorre uma perda no faturamento de cerca de US$ 8,5 milhões. O setor industrial não deseja uma queda nos preços internacionais, que representam divisas para o país. Porém, com a colocação dos estoques públicos na proporção de 40% da necessidade do consumo interno, seria possível não sujeitar o consumidor brasileiro à atual política altista e isso sem atrapalhar o esquema de retenção necessário à manutenção dos compromissos assumidos pelo Brasil no mercado internacional e que vêm sendo cumpridos.
A continuar essa política de preços elevados, a queda no consumo interno poderá ser proporcional a 2 milhões de sacas/ano, o que para o futuro da cafeicultura brasileira pode trazer efeitos extremamente nocivos.
Já é hora do complexo cafeeiro nacional, juntamente com o governo, olhar com mais consideração para o consumidor brasileiro.

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