São Paulo, quarta-feira, 6 de abril de 1994
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A salada eleitoral

Qualquer eleitor que quiser decidir o seu voto, no dia 3 de outubro, a partir de um posicionamento ideológico corre o risco de enlouquecer com as cédulas na mão. A ciranda de alianças que se vão desenhando parece representar, acima de tudo, a pá de cal na já escassa consistência programática dos partidos políticos brasileiros.
Se cada um dos principais candidatos presidenciais decidir subir ao palanque de seus respectivos candidatos estaduais, acabarão quase todos os partidos juntos no mesmo comício, ao menos em certos Estados. Um exemplo, entre muitos outros possíveis: a coligação que se articula em Rondônia envolve PT, PMDB e PSDB, em torno de uma candidatura peemedebista.
Ou seja, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e, no PMDB, Orestes Quércia ou José Sarney, justamente os que parecem ser os maiores rivais no pleito presidencial, poderão apoiar o mesmo candidato.
Além da fluidez programática dos partidos, essa confusão decorre também das diferenças entre os Estados, o que faz com que, por exemplo, o PMDB do Rio Grande do Sul seja bastante diverso do PMDB de São Paulo. Ou com que o PSDB da Bahia se revolte contra a intenção da cúpula nacional do partido de coligar-se com o PFL, justamente o maior rival dos "tucanos" da Bahia. Numa eleição "casada", a primeira em meio século, o peso das diferenças regionais reaparece com toda a sua força.
A fragilidade institucional dos partidos leva, igualmente, ao desvirtuamento de mecanismos que são, em princípio, democráticos e praticados em países mais desenvolvidos. É o caso das prévias. A cúpula do PMDB, agora, passou a defendê-las. Mas o faz não porque o mecanismo seja mais democrático do que a convenção. A tese da prévia é, claramente, uma tentativa de bloquear a candidatura de Quércia.
Tudo somado, o que se comprova é a extrema fragilidade do sistema brasileiro de partidos. Esse é um dos nós que precisa ser desatado se o país quiser de fato se organizar. Por mais desprestigiados que estejam os políticos em geral e, por extensão, os partidos, o fato é que o mundo ainda não inventou outro sistema de intermediação entre o Estado e a sociedade que não seja a política e, em consequência, os partidos políticos.

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