São Paulo, quinta-feira, 7 de abril de 1994
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Bosi analisa "naturalismo" de Da Vinci

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O professor de literatura da USP Alfredo Bosi terminou sua palestra sobre Leonardo da Vinci –que inaugurou na noite de terça, no Masp, o ciclo de conferências "Artepensamento"– com uma frase do artista renascentista: "Os seres não vão para o nada".
Foi ovacionado. Era, de certa forma, uma homenagem. No início da noite, Bosi havia dedicado sua conferência ao professor José Américo Motta Pessanha, morto prematuramente no ano passado e um dos nomes recorrentes entre os palestrantes dos ciclos anteriores organizados por Adauto Novaes ("Os Sentidos da Paixão", "Tempo e História", "Ética" etc.).
Segundo Novaes, "Artepensamento" não tem como objetivo ser "uma série de conferências sobre as artes, mas sobre o pensamento nas artes".
Bosi optou por analisar como Leonardo da Vinci (1452-1519) combinou idéias díspares, o neoplatonismo de seu tempo com um materialismo precursor da ciência moderna, na criação de um pensamento propriamente artístico.
Pouco a pouco o artista vai se afastar da imagem platônica da caverna (um lugar de seres degradados, de trevas e de enganos, de onde o homem precisa sair para alcançar a sabedoria), e vai se sentir atraído pelas "formas degradadas", pelos animais, pelo interior da caverna, pelo mundo das paixões, pelos corpos e sua anatomia.
Chamando esse universo próprio da caverna de "necessidade", Leonardo vai "dialetizar", segundo Bosi, o pensamento espiritualista platônico através de um naturalismo que anuncia o nascimento da ciência moderna.
Para Leonardo, "sem a necessidade (a natureza, os corpos, a matéria) não existe experiência nem sabedoria". Ao contrário do neo-platonismo dominante em sua época (é preciso elevar-se para chegar à sabedoria), Leonardo toma o caminho inverso, descendo ao nível mais baixo, onde existem trevas, para compreendê-las (é um dos primeiros a ir aos necrotérios dissecar cadáveres para compreender a anatomia humana).
Na obra de Leonardo da Vinci, tanto nas pinturas como nos desenhos e mesmo nos cadernos de anotações, coexistem esses dois aspectos do pensamento, o espiritualismo dominante em seu tempo e o materialismo que anunciava o mundo moderno, onde a expressividade e a subjetividade (sobretudo a partir do romantismo, no século 18) também passam a ocupar um lugar de destaque.
"A pintura é uma coisa mental para Leonardo. Essa fusão de coisa e mente é o que torna o discurso dele extremamente original", diz Bosi.

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