São Paulo, quinta-feira, 7 de abril de 1994
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Prostitutas ganham nova concorrente

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Mais uma puta nas locadoras. Seu nome: Amy. Ela dá o que eles gostam em "De Volta à Estrada" (Back Roads, Abril Vídeo), mas sua intérprete, Sally Fields, cá entre nós, não tem o físico do papel. Operária, manicure, balconista –papéis assim Sally tira de letra, mas a profissão mais antiga do mundo não lhe cai bem. Difícil acreditar que alguém queira ir para a cama com ela, e ainda por cima pagando. Tommy Lee Jones não só vai como ainda por cima se apaixona por ela.
Entusiasmado com o sucesso de "Norma Rae" –e também com o Oscar que por aquele papel Sally empalmou em 1979–, Martin Ritt (1919-1990) apostou suas fichas nesse "road movie" de 1981 cujo retumbante fracasso de crítica e bilheteria deixou a Warner perplexa. Se não me engano, "De Volta à Estrada" nem foi lançado na Europa e ao Brasil só está chegando agora em vídeo, 13 anos depois.
Não se perdeu nada. Foi um dos muitos equívocos que o bem-intencionado autor de "Testa-de-Ferro Por Acaso" cometeu ao longo de uma carreira que começou promissora ("Um Homem Tem Três Metros de Altura") e logo se rendeu à mediocridade, vulgarizando Faulkner e Hemingway.
Sensível aos dilemas sociais e existenciais de negros, trabalhadores e demais segmentos postos à margem do sonho americano, Ritt só se mostrou à altura de suas ambições em "Ver-te-ei no Inferno" (The Molly Mcguires), recebida com simpatia por críticos progressistas. Diante de "Back Roads", porém, todos se calaram –e nunca mais Ritt emplacou um hit.
Os destituídos desta vez são uma prostituta e um boxeador vira-lata (Lee Jones), que se mandam de Mobile (Alabama) para Los Angeles com a cara, a coragem, e acabam flechados por Cupido no meio do caminho.
A América percorrida pelos dois difere um pouco da que Richard Beymer ia descobrindo em "As Aventuras de um Jovem", outro filme estradeiro de Ritt. Ela é mais sórdida, mais contrastante com as radiosas imagens perpetuadas em filmes e comerciais bucólicos sobre refrigerantes, cigarros e "fast food". Um expressivo pano de fundo mal servido por personagens ocos e desenxabidos.
Sem contar que Sally perde feio para todas as mariposas disponíveis em nossas locadoras.
Mariposas em vídeoO que temos nas prateleiras? Por ordem de entrada em cena, Bette Davis em "Servidão Humana", Vivien Leigh em "A Ponte de Waterloo", Giulietta Masina em "Noites de Cabíria", Shirley MacLaine em "Irma La Douce", Catherine Deneuve em "A Bela da Tarde", Jane Fonda em "Klute - O Passado Condena", Kathleen Turner em "Crimes de Paixão", Julia Roberts em "Uma Linda Mulher", Jennifer Jason-Leigh em "Noites Violentas no Brooklyn" e Theresa Russell em "A Prostituta".
Dá para se montar um expressivo ciclo doméstico (veja quadro ao lado), pegando desde as piranhas disfarçadas de garçonetes (casos de Bette Davis e Vivien Leigh) até as mais explícitas, como Cabíria, Trá-lá-lá (a puta barra pesada encarnada por Jennifer Jason-Leigh), Vivien (a cinderelesca "hooker" celebrizada por Julia Roberts) e a "belle de soir" miss Turner, passando pelas do tempo em que a censura só permitia prostituição em comédias (e foi nessa frincha que o moleque Billy Wilder entrou).
Frincha, em Minas Gerais, também quer dizer meretriz. Aprendi isso, veja só que coincidência, lendo o comentário de um velho crítico das Alterosas sobre Sadie Thompson, a rameira número um dos mares do sul criada por Somerset Maugham e consagrada na tela por Gloria Swanson, Joan Crawford e Rita Hayworth.
Para não falar das grandes findingas européias, sem vez por estas bandas. Anna Magnani e Sophia Loren fizeram muito "trottoir", assim como quase todas as estrelas do cinema francês anteriores a Catherine Deneuve, com destaque especial para Jeanne Moreau e Anna Karina, a "putaine" favorita de Godard. Se bobear, a grega Illia chega aqui antes de todas essas. Illia, mais conhecida como Melina Mercouri, rodava a bolsinha no porto de Pireu. Nunca aos domingos. (Sérgio Augusto)

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