São Paulo, sexta-feira, 8 de abril de 1994
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Paladinos da ignorância

Mais uma vez, a liberdade de expressão e o direito das pessoas à informação –garantias mesmas da democracia– vêem-se ameaçados. Trata-se da intenção de alguns parlamentares de incluir, e portanto petrificar, na Constituição dispositivo que proíbe a divulgação de pesquisas de intenção de voto nos 120 dias que antecedem a eleição.
Os defensores da supressão de liberdades argumentam que a publicação de sondagens interfere no resultado do pleito. É claro que interfere, como de resto o faz qualquer espécie de conhecimento. É óbvio que, se toda a população soubesse de fato ler e escrever e tivesse acesso a informações críticas sobre os candidatos a qualquer cargo eletivo, os resultados das eleições seriam muito diferentes –e provavelmente para melhor.
Entretanto, em vez de empenhar-se nas reformas necessárias e urgentes para a construção de uma sociedade informada e democrática –e elas são muitas–, os inimigos das liberdades preferem simplesmente exumar da poeira de um passado sombrio mecanismos que impedem o cidadão de tomar conhecimento de informações que ele pode legitimamente considerar relevantes. A infeliz iniciativa é, de resto, uma clara afronta às diversas passagens da Carta que inscrevem de forma cristalina a liberdade de imprensa no Direito brasileiro.
E mais, considerar espúria a influência de pesquisas sobre o resultado de um pleito é uma concepção no mínimo ingênua do processo eleitoral. É acreditar que a escolha de um dirigente político se dá como uma espécie de manifestação mágica de uma suposta Vontade Geral que seria imune a todo tipo de interferência, como a dos órgãos de comunicação de massa, do poder econômico, de acordos políticos, de estruturas sindicais e de igrejas, entre muitos outros.
Enfim, é profundamente lamentável constatar que, uma vez mais, sabe-se lá em nome de quais interesses, políticos brasileiros procuram apelar à velha estratégia que lhes vem garantindo a hegemonia desde que aqui foram instaladas as primeiras urnas: manter a população sob o véu da ignorância, de todas as maneiras possíveis.

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