São Paulo, domingo, 10 de abril de 1994
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Brasil e Polônia têm experiência parecida

RYSZARD PIASECKI
ESPECIAL PARA A FOLHA

A análise dos resultados dos programas de estabilização e de ajustes estruturais nos países latino-americanos possui significado muito importante para os países centro-europeus "em fase de transição", incluindo a Polônia. Existem várias questões relativas a como e até que ponto a experiência da transformação econômica do Brasil e de outros países da região poderia ser útil aos países ex-comunistas, que passam por seu próprio processo de "transição".
É evidente que existem grandes diferenças entre os dois grupos de países no que diz respeito às condições econômicas, culturais e sócio-políticas de suas respectivas transformações democráticas. O principal problema da América Latina é a melhoria do mecanismo de mercado, enquanto na Europa Central a economia de mercado está "in statu nascendi", após quase meio século de desastrosa experiência com o planejamento centralizado da economia, que não respeitou as regras econômicas.
Embora o processo de liberalização econômica e restruturação estrutural (por exemplo, a privatização das estatais) nem sempre seja muito veloz na América Latina, estes países já amealharam uma experiência significativa que poderia ser benéfica para os países pós-comunistas, ao mesmo tempo poupando-os de determinados erros e enriquecendo-os com uma série de soluções aplicadas com êxito em outras partes.
É verdade, porém, que um mercado de ações muito profissional e extremamente dinâmico foi criado recentemente em Varsóvia. Na verdade, o nível de desenvolvimento econômico da Polônia está muito mais próximo daquele do Brasil, do Chile ou do México do que do Reino Unido ou da Alemanha. Os países latino-americanos contam há muitos anos com sua própria estratégia de desenvolvimento econômico fundamentada na substituição de importações.
Sob alguns aspectos e até certo ponto esta estratégia era bastante semelhante à economia centralmente planejada. Por exemplo, ambas as economias eram fortemente protegidas contra a concorrência estrangeira, para ajudar suas próprias indústrias e a mão-de-obra local. Como sabemos, as economias orientadas à exportação e abertas à concorrência mundial terminaram por mostrar-se muito mais bem-sucedidas, a longo prazo.
A experiência latino-americana nos diferentes aspectos da transformação e da liberalização econômica (por exemplo, diferentes resultados no combate à inflação, na privatização de estatais, na atração de capitais estrangeiros etc.) poderia ajudar os países centro-europeus a evitarem erros. Seria mais fácil implementar o programa polonês de privatizações se se soubesse que a principal barreira a este programa era a ineficiência do mercado financeiro.
Os países latino-americanos têm muito mais experiência na compreensão do relacionamento entre privatização e liberalização econômica, assim como na atração de investimentos estrangeiros diretos, na organização do sistema bancário e assim por diante.
Os países da Europa Central, por outro lado, possuem uma experiência bastante útil na implantação de um setor privado (na Polônia o número de empresas privadas aumentou de 15 mil em 1989 para 1,7 milhão em 1993), na privatização maciça por cupons (na República Tcheca pretende-se privatizar mais de 1.000 estatais seguindo esse esquema) ou no combate à inflação.
Mas ainda restam muitos problemas não resolvidos. Será que a privatização sempre levará a uma competitividade maior da economia nacional? Como devemos combater monopólios privados? Qual deve ser o papel real do setor público no futuro (obviamente não poderá ser totalmente abolido)?
A Polônia, sem dúvida alguma, foi a pioneira da região centro-européia na transição ao capitalismo. Em 1990, o novo governo polonês, formado a partir do sindicato Solidariedade, lançou ampla e radical reforma orientada ao mercado, para mudar o velho sistema ineficiente. Foi uma decisão muito difícil e dolorosa (a renda nacional e a produção industrial apresentaram quedas, os salários reais caíram, o índice de desemprego foi para 15% e as desigualdades sociais aumentaram significativamente), tomada para fazer a economia comunista passar por uma "terapia de choque" que a levaria em direção ao sistema de mercado.
Teve início na Polônia um processo único e simultâneo de construção do sistema democrático, do Estado de Direito à economia de mercado. Desde o início da "transição" havia uma visão comum de que, sem democracia, não seria possível criar uma economia de mercado próspera. A transformação da economia dos ex-comunistas requer medidas como: estabilização macroeconômica; reformas de preço, de mercado e comerciais; desenvolvimento do setor privado, privatização e reestruturação de empresas, e mudanças no papel do Estado.
Hoje é possível afirmar que a transição econômica na Polônia foi mais um sucesso do que um fracasso. A Polônia conseguiu uma quase vitória no combate à inflação (de 1.200% em 1989, ela passou para 27% este ano) e em muito pouco tempo criou um setor privado muito importante: em 1994, 60% da força de trabalho e 50% do PNB são originários do setor privado. No ano passado, a Polônia registrou um crescimento econômico de 5% (o mais alto entre os países europeus).
Devido às acima citadas interessantes analogias e experiências mútuas de todos estes países que se encontram em processo de transformação, parece que existem muitas possibilidades para o desenvolvimento de laços econômicos, comerciais, científicos e culturais entre a América Latina e a Europa Central, e mais especialmente entre o Brasil e a Polônia.

Tradução de Clara Allain

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