São Paulo, sábado, 16 de abril de 1994
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Griffiths lembra tragédia do Vietnã

ANA MARIA GUARIGLIA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Philip Jones Griffiths foi um dos fotógrafos mais ativos na Guerra do Vietnã (1964-1975) (leia texto ao lado): participou durante três anos e fez o livro "Vietnam Inc." Lançado durante a guerra (1971), abalou a opinião pública, porque previa a derrota dos Estados Unidos, até hoje considerada vergonhosa para o país.
Com 58 anos de idade e 42 de profissão, Jones continua fazendo dos atuais conflitos bélicos e da violência, o cenário para sua luta aberta em favor da paz.
Por seus trabalhos, ele está sendo homenageado com uma exposição retrospectiva internacional itinerante, que começou em Houston (Texas), em 1990.
São 150 fotos, que também estiveram na Feira de Arte Contemporânea, na Espanha, em 1992. Agora, estão percorrendo as cidades norte-americanas. Jones falou à Folha por telefone, de Nova York, onde escreve o roteiro de um filme sobre o Vietnã.
*
Folha - Dizem que você não é voltado ao lado comercial da fotografia, mas é fotojornalista. Como você encara isso?
Philip Jones Griffiths - Acho que algumas imagens não têm preço. Atualmente, fotos da miséria e da guerra estão rendendo muito, como as que aparecem nas propagandas da Benneton, que se utiliza do uniforme manchado de sangue de soldados da Bósnia para vender suas roupas. Quanto a mim, apenas vivo do meu trabalho e tento comunicar o que sinto.
Folha - Foi essa a sua intenção ao fazer um livro sobre o Vietnã e lançá-lo durante a guerra?
Griffiths - Me envolvi com o Vietnã porque percebi que um país queria impor seu sistema de valores a outro. Tentei superar a natural aversão que os vietnamitas tinham pelo domínio da "cultura Coca-Cola", que os matava por se mostrarem resistenmtes.
Percebi também que a maioria dos rapazes, concentrada no lado "bangue-bangue" da guerra, havia esquecido suas motivações fundamentais. Meu livro tenta mostrar que os americanos deveriam conhecer aquele povo admirável e não matá-lo.
Folha - Então, você se tornou simpático à causa vietnamita?
Griffiths - Minhas experiências no Vietnã me levaram a ser solidário com seu povo.
Folha - Você entrou na agência Magnum a convite de Cartier-Bresson. Suas imagens absorvem influências desse fotógrafo?
Griffiths - Bresson é o mestre da mistura da forma e do conteúdo e eu me considero seu discípulo.
Folha - É por este motivo que você usa imagens em preto-e-branco?
Griffiths - Veja, a fotografia envolve a captação da realidade e, para mim, isso significa usar o preto-e-branco. A cor normalmente reduz essa intenção.
Folha - E quanto ao livro "Vietnam Inc.": por que o idealizou sozinho?
Griffiths - Meu livro foi como um filme: fotografei, editei as fotos, escrevi os textos e planejei a edição. Era inconcebível fazê-lo de outra forma.
Folha - Você acha que se ele fosse lançado hoje teria perdido o impacto, devido à rapidez da televisão, que, à época da guerra, não era tão ágil?
Griffiths - O fotojornalismo depende do tratamento que se dá à imagem, seja na mídia impressa ou eletrônica. Mas, na maioria das vezes, o público é devorado por uma massa de imagens, que acaba não tendo o menor senso. Exemplo disso, foram as reportagens sobre a Guerra do Golfo: quanto mais se mostravam imagens, menos se entendia o conflito. A situação foi perfeita para os "mandarins de Washington". Com relação à Guerra do Vietnã, muita documentação foi feita e, no geral, a TV e as revistas fizeram registros significativos, embora não evidenciassem a crueldade das violências.
Folha - Com base na sua exeperiência no Vietnã, você acredita que a violência é uma
característiva inerente à natureza humana?
Griffiths - Nos EUA, a violência é endêmica, mas não acredito que as pessoas sejam
naturalmente violentas. O sistema produz frustrações e a resposta é a violência. No caso do Vietnã, empunhar as armas não foi a resposta. A despeito de seu poder, a América perdeu a guerra.

O livro "Vietnam Inc." pode ser encomendado na livraria Freebook (r. da Consolação, 1.924, tel. (011) 259-1351.

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