São Paulo, quinta-feira, 21 de abril de 1994
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Considerações sobre a ética

DOMINGO MARCOLINO BRAILE

Numa época em que a inflação destrói o caráter das pessoas, eliminando o valor da palavra empenhada, a ética deixa de ser predicado do governo ou mesmo da nação.
Será ético deixar que pacientes morram às portas dos hospitais, esperando por uma vaga que nunca é obtida, ou então nas longas filas de espera de onde nunca são chamados? Será ético pagar aos médicos e hospitais quantias irrisórias e ainda com atrasos corrosivos, que anulam toda vontade e levam ao sucateamento irresponsável das instituições de saúde?
Diante deste quadro não temos respostas que possam resistir à mais simples das análises. Não é justo abandonar os doentes que perderam a saúde por falta de prevenção de doenças facilmente evitáveis. Não é justo também abandonar os doentes que perderam a saúde no exercício de suas profissões, nos acidentes de trabalho, nos acidentes de tráfego.
Um país que vinha investindo US$ 80 por habitante por ano na saúde, há dois ou três anos, quando nos Estados Unidos se investe US$ 3.000, e que no último ano perversamente baixou este gasto para menos de US$ 60, não é digno do respeito das nações do mundo.
Existem no país 85 faculdades de medicina que formam cerca de 10 mil médicos por ano, com baixo nível de conhecimentos, pois a massa de professores, embora extremamente dedicada, recebe pagamentos irrisórios e apenas 5% deles têm títulos universitários, devido à falta total de incentivos.
Dos médicos recém-formados, apenas 18% encontram vagas em residências médicas reconhecidas; os demais têm que exercer a profissão sem os conhecimentos indispensáveis para serem resolutivos.
Os médicos mal remunerados perdem todo interesse pela profissão, que passa a representar apenas um emprego. Raramente associam-se às entidades de classe, tendo em vista a economia de uns míseros cruzeiros, quase nunca frequentam cursos de atualização ou congressos, em função da falta de recursos, e raramente investem na assinatura de uma revista médica.
Sabemos que o país tem problemas econômicos, mas não é pobre, tem uma distribuição de renda selvagem, mas é a oitava economia do mundo e, ao lado de recursos naturais valiosos, tem uma indústria competitiva.
A resolução dos problemas da saúde depende da vontade política não só dos governantes, mas também da própria sociedade, ao desejar contribuir de forma a sentir a equipe multidisciplinar da saúde como uma conquista e motivo de segurança e orgulho para todos.

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