São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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Africâners mudam para evitar mudanças

MARCELO MUSA CAVALLARI
DA REDAÇÃO

Os africâners que se negam a participar das eleições sul-africanas mantêm viva uma carcterística básica de sua presença na história sul-africana. Desde o século 17 se recusam a se misturar e preferem se mudar a aceitar mudanças.
Eles descendem dos holandeses e protestantes franceses que chegaram ao sul da África em 1652. Parte desses colonizadores cultivava a terra em volta da Cidade do Cabo. Outra parte, os Boer, criava carneiros em regime semi-nômade e foi penetrando no território.
O casamento entre brancos e não-brancos já era proibido em 1685. Não-brancos, então, eram os khoi, que habitavam a costa ocidental da África do Sul quando os holandeses chegaram, e os escravos, trazidos de outras partes do continente.
Esses não-brancos deram origem ao que a legislação sul-africana do apartheid chamava de "coloured". Eles tinham direito a voto, mas a Câmara que elegiam não tinha poder real.
Os atuais negros sul-africanos descendem dos povos que falam línguas bantu. Eles invadiram a região no século 18.
No fim do 19, os britânicos entram na história. Invadem a província do Cabo e, depois de idas e vindas ao sabor das guerras contra Napoleão, se instalam definitivamente no país em 1806.
A lei britânica –com cortes de Justiça para todos os cidadãos, liberdade de imprensa– era um tanto liberal para os padrões africâners. Quando, na primeira metade do século 19, decretou-se a libertação dos escravos, os boers decidiram se mexer.
Um grupo de 12 mil deles saiu andando em direção ao que são hoje as províncias de Orange, Transvaal e Natal.
A marcha dos "Voortrekkers" (pioneiros) é o orgulho dos africâners até hoje. "Eu não posso confiar nesses negros. Veja o que aconteceu com Piet Retief", disse nesta semana o policial de trânsito Gert van der Merwe, de Transvaal, explicando por que faz parte de um grupo que quer estabelecer um país separado só para africâners.
Piet Retief era o líder dos "Voortrekkers". Ele justificou o abandono de suas terras em direção ao leste dizendo que os ingleses tinham subvertido "a relação apropriada entre servos e patrões".
O que aconteceu com ele –que ainda assusta Van der Merwe– foi ter sido morto pelos zulus com um grupo de 200 pessoas quando negociavam compra de terras.
Curiosamente, foram os zulus os maiores aliados dos africâners no boicote às eleições. Até esta semana, quando Mangosuthu Buthelezi resolveu ser candidato.

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