São Paulo, sábado, 7 de maio de 1994
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Movimento sai da periferia rumo ao sucesso

MARCELO PLASSE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Como o samba, o rap solidificou um espaço que não depende mais do marketing da indústria.
"Se um dia o rap sair das rádios, é o pessoal da periferia que vai mantê-lo vivo", prevê o platinado Gabriel. "Pode sair do `Faustão', mas não do Santana Samba."
O motivo é evidente. O rap fala da esquina, do bar, do dia-a-dia do bairro. "Quando você ouve Racionais e Thaide", diz o rapper Gog, de Brasília, "você tem orgulho de morar na periferia."
Mano Brown assume: "Não sou porta-voz do movimento hip hop, mas da periferia –talvez".
Ele tem consciência da responsibilidade. Quer passar uma mensagem, que, em muitos pontos, coincide com a do líder negro americano Malcolm X.
"Algumas coisas são básicas", diz Brown. "A auto-valorização, o estudo e a distância de tudo o que faz mal –bebida, droga e novela. Lutar para ter as coisas, mas evitar que o dinheiro suba à sua cabeça e você vire ladrão."
A imagem do rapper fora da periferia é equivocada, diz KLJ, DJ do Racionais: "Os caras acham que é tudo `gangsta' (facção violenta do rap americano), de calça larga e tênis caríssimo. Aqui na periferia não tem disso, não."
"As informações da mídia são muito americanizadas", diz Brown. "Sempre nos comparam com Snoop Doggy Dogg e Dr. Dre, quando a gente tem mais a ver com o pessoal do samba."
A imagem do "gangsta" é a mais controvertida no rap. Nos EUA, o estilo glamouriza a violência, o uso de drogas e o machismo.
"Nosso rap prega a não-violência e é contra a discriminação racial e sexual", diz X, do grupo Câmbio Negro, de Brasília. Ele marca bem a posição, porque o visual agressivo da banda (são carecas) remete ao grupo "gangsta" americano Onyx.
"Meu medo com o `gangsta', explica o carioca Big Richard, ex-Consciência Urbana, "é que ele contribua para o extermínio de uma raça e para descrédito dos próprios rappers".
Richard, que organizou a coletânea carioca "Tiro Inicial", considera o "gangsta" um erro: "Leva a fumar maconha, dar porrada e matar, e, assim, a que tenha mais negros nas casas de detenção."
Piveti, ex-Pavilhão 9, se diz "gangsta". Descobriu o rap na Febem, aos 15 anos (hoje tem 19). "Se não tivesse descoberto o rap, já estaria sob sete palmos."
O pai de Piveti e o irmão de Rhossi, do Pavilhão 9, foram assassinados nas ruas de São Paulo.
"Não preciso me inspirar no (`gangsta') Ice Cube", diz Rhossi. "Não entendo o que ele fala, mas sinto a violência na pele."

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