São Paulo, segunda-feira, 9 de maio de 1994 |
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Jerusalém
ISRAEL ISSER LEVIN
Há cidades que nos agradam logo à primeira vista por sua beleza natural ou arquitetônica (Rio e Paris são bons exemplos) e outras que temos de conhecer mais a fundo para podermos amá-las (como São Paulo ou Nova York). Jerusalém consegue a proeza de nos agradar à primeira, à segunda e à qualquer vista. Logo de início nos encantamos com sua topografia, cidade montanhosa próxima da planície litorânea e da depressão do Mar Morto, dominando toda a paisagem. Nos encantamos com seu ar, suas ruelas, suas cores e formas, seus cheiros que simbolizam a mistura de culturas que a cidade sempre propiciou. Depois, vamos conhecendo-a melhor e o que era simpatia momentânea se transforma em paixão. Não há como não ficar impregnado com seu misticismo, sua atmosfera de cidade que tudo viu e tudo sabe, mestra generosa disposta a ensinar a seus cidadãos e visitantes apaixonados um pouco do que ela reuniu de sabedoria ao longo de milênios de cuidadosa aprendizagem. Mas se queremos mesmo amá-la e não apenas desfrutá-la como amor passageiro, temos de penetrar em suas entranhas, desvendá-la, conhecer seus locais secretos e cantos pouco visitados, recuperar a história de cada muro, de cada pedra, perceber seus sons longe do burburinho dos turistas apressados, flagrar os raios de sol beijando suas vielas. Engana-se quem pensa que Jerusalém é uma cidade só: há uma superfície, que pode ser vista, há outra que começa a ser desenterrada, que pode ser compreendida. Há ainda outra que paira no ar e só pode ser sentida. Estas três são a capital de Israel. Como separá-las? A reunificação de Jerusalém em 1967, que completa hoje 27 anos, não foi a junção de duas cidades transformadas numa só, mas o reencontro de facetas de uma mesma cidade. Jerusalém é sagrada para os cristãos, por tudo o que ela recorda da presença e da morte de Jesus. Mas a sede do catolicismo fica em Roma e o cristianismo tem muitas cidades–santuários como Lourdes ou mesmo Aparecida. Os muçulmanos adoram as mesquitas, que com suas belas cúpulas marcam a paisagem de Jerusalém. Mas também para eles Meca e Medina são mais sagradas. Para os judeus, Jerusalém foi e é tudo, uma vez que, como imaginário coletivo, ajudou o povo judeu a se manter unido. Hoje ela representa o ponto de encontro de judeus do mundo todo, russos e etíopes, ocidentais e orientais, religiosos, tradicionalistas ou ateus. O longo caso de amor entre o povo e sua capital não pode ter outro fim. Após muitas peripécias se encontram, caem nos braços um do outro e são felizes para sempre. Texto Anterior: A farsa da denúncia Próximo Texto: Bandeira nas manhãs de domingo; Aposentados pagam a contra; Poder monetário da confiança; Desaparecimentos e execuções; Elis Regina em evolução; Dentes do Leão; Por onde anda o pedestre?; A inteligência dos cães; Sobrevivência Índice |
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