São Paulo, terça-feira, 10 de maio de 1994
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Nelson Mandela é eleito presidente

JOHN CARLIN
DO "THE INDEPENDENT", NA CIDADE DO CABO

Nelson Mandela, que já foi o preso político mais famoso do mundo, tornou-se ontem o primeiro presidente democraticamente eleito da África do Sul.
Quatrocentos deputados negros e brancos –a maioria negros–, reunidos no antigo reduto do apartheid, aclamaram o anúncio feito pelo presidente do Supremo Tribunal sul-africano, Michael Corbett, de que Mandela havia sido eleito por unanimidade para liderar o novo governo de unidade nacional.
"Pela primeira vez em nosso país", disse Corbett, "temos um governo pelo povo, do povo e para o povo".
O presidente Mandela só expressou seus sentimentos quando estava diante de dezenas de milhares de pessoas, no balcão da Prefeitura da Cidade do Cabo –palco de seu primeiro discurso público depois de sua libertação da prisão, em fevereiro de 1990.
O arcebispo Desmond Tutu disse, apresentando Mandela: "Este é o dia feito pelo Senhor. Este é o dia de libertação para todos nós, negros e brancos juntos –para nós, o povo do arco-íris de Deus!"
Esbanjando entusiasmo, acrescentou: "Ei-lo aqui! O homem do momento! O homem da década! E, para nós, o homem do século!"
Um grande coral cantou a música que é o sucesso do momento no país: "África do Sul, nós te amamos, nossa terra linda, vamos mostrar ao mundo inteiro que podemos trazer a paz à nossa terra".
O presidente soltou uma pomba branca, símbolo da paz.
"Hoje", declarou Nelson Mandela em voz retumbante, "celebramos não a vitória de um partido, mas a vitória de todo o povo da África do Sul. É apropriado que seja aqui, no Cabo da Boa Esperança, que estejamos deitando a pedra fundamental do novo país".
Foi no Cabo da Boa Esperança que, três séculos atrás, "aconteceu a fatídica convergência de povos vindos da África, da Europa e da Ásia. Foi também no Cabo da Boa Esperança, na ilha Robben, que gerações de combatentes da liberdade ficaram presos".
Atrás do presidente Mandela erguia-se o espetacular monolito da montanha Table, para a qual Mandela olhava durante os 18 anos que ficou encarcerado na ilha Robben.
Mandela prometeu "o mais dinâmico programa de melhorias sociais da história deste país" e conclamou todos os sul-africanos a colocarem fim às divisões e desconfianças.
O desafio é criar uma nova ordem baseada na justiça para todos, disse Mandela.
Desafio nada fácil. Este fim-de-semana, por exemplo, morreram 28 pessoas na província de Kwazulu-Natal, a maioria em conflitos políticos.
O gabinete, que pela primeira vez reflete a diversidade racial do país, foi praticamente completado ontem, quando o vice-presidente Frederik de Klerk nomeou os seis ministros aos quais o Partido Nacional tem direito constitucional.
As nomeações não surpreenderam ninguém. Derek Keys continuará sendo ministro das Finanças.
Pik Botha, que até ontem havia sido o chanceler com mais tempo no cargo no mundo, assume a pasta da Energia, e Roelf Meyer continua como ministro do Desenvolvimento Constitucional.
O único cargo ministerial importante ainda não definido era o do Interior. Especulava-se que poderia ser oferecido ao líder do Inkatha, Mangosuthu Buthelezi.

Tradução de Clara Allain

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