São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 1994
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Greenberg reinou 30 anos na crítica

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Analisar a carreira de Clement Greenberg, o crítico de arte morto no último sábado, em Nova York (EUA), é perceber um bocado da história da arte deste século.
Greenberg (1909-1994) foi por 30 anos o mais influente crítico de arte americano. Neste século que será lembrado pela americanização do mundo, isso significa uma influência e tanto.
É preciso dizer que Greenberg só pôde ter essa força graças a seu estilo límpido, desprovido de jargões e sem medo de "impressionismos". Era capaz de escrever assim: "Não existem muitas telas boas nesta exposição" –e em seguida as enumerava.
Vindo de origens modestas (o bairro do Bronx, em Nova York) e de uma universidade considerada competente no setor história da arte (Syracuse), Greenberg logo se firmou como crítico ousado e sóbrio ao mesmo tempo.
Sua carreira começou nos anos 30, na "Partisan Review". Em 1939 escreveu seu mais célebre ensaio, "Avant-Garde e Kitsch".
Nele, fez a mais persuasiva distinção entre a grande arte e a arte comercial, emotiva, efêmera. Para Greenberg, o que move o artista é o desafio técnico. Não é a expressão de sentimentos ou mensagens.
Ali começava a carreira do papa (uma caricatura de David Levine mostra-o de papa) da arte abstrata. Greenberg fez o que qualquer crítico daqueles tempos gostaria de fazer: licenciou com argumentos poderosos um movimento artístico novo. (Hoje os críticos são bem menos idealistas, felizmente.)
Nos anos 50, Greenberg se engajou no expressionismo abstrato. Proclamou as virtudes de William de Kooning, Franz Kline e, sobretudo, Jackson Pollock. Para ele, os modernistas tinham liquidado uma velha tradição, não estabelecido uma nova. Os expressionistas abstratos, esses estabeleceriam.
Já nos anos 40 ele estava convencido disso: "Não há nada na natureza da arte abstrata que a faça superior. O imperativo vem da história".
Esse, o grande equívoco de sua carreira. Obviamente a idéia de imperativo histórico Greenberg buscou em Marx (e era um marxista de formação, ainda que anticomunista ferrenho).
Para ele, o expressionismo abstrato levava pela primeira vez aos EUA "uma arte apolínea, baseada na racionalidade". Isto é, ainda que privilegiasse o gesto, a ação de pintar, uma tela expressionista abstrata traduzia de forma "impessoal" a experiência do pintor.
Esse raciocínio levou Greenberg a desdenhar tudo que não fosse abstrato e lidasse com convenções reais: Miró, Klee, Rauschenberg. Mesmo Pollock, quando na metade dos anos 50 voltou à figura, deixou de interessá-lo.
Muitos ainda enxergam o modernismo pelos antolhos de Greenberg: o modernismo seria a exaltação da construção no lugar da expressão, do racional em lugar do drama. Aos poucos, essa distorção vai sendo corrigida.
Greenberg parou de escrever em 1969. Sumiu da cena cultural americana sobre a qual tinha reinado tanto tempo. Ficou ultrapassado. Mas seus textos não têm hoje só interesse histórico; embora errem no atacado, acertam no varejo.
Um exemplo só: David Smith. Já em 1947 Greenberg chamou atenção para o maior escultor americano do século. Se mais não fosse, esse já seria um legado respeitável.
Quem quiser conhecer Greenberg pode encomendar os quatro volumes de seus ensaios, "The Collected Essays and Criticism", da University of Chicago Press.

Importadoras: Livraria Cultura (tel. 011/285-4033) e Dragone (223-3316).

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