São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A hora da verdade

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Lula prometeu comprar submarinos nucleares e mísseis de última geração. Platéia que recebeu a promessa: banqueiros e empresários norte-americanos, em Nova York. Para não fazer feio, o candidato FHC não fez, mas cumpriu a promessa de todo nordestino: foi rezar ao Padim Ciço, no Ceará. Bem verdade que FHC é carioca e acredita no Padim Ciço tanto quanto eu acredito no Plano Real. Mas vale o registro dos dois principais candidatos até agora lançados.
À primeira vista, dá a impressão de erro de edição ou montagem. FHC deveria estar em Nova York explicando as virtudes e milagres do Padim Ciço. E Lula deveria estar em Juazeiro, assombrando os devotos do Padim Ciço com a promessa de equipar o sertão com submarinos nucleares e mísseis sofisticados. As coisas ficariam mais honestas, haveria maior transparência.
Não é de admirar que, depois de eleitos, pagando o preço de campanhas eleitorais mal editadas ou montadas, os candidatos não sejam os mesmos. Lula jamais se imaginou diante de um auditório do Primeiro Mundo ameaçando comprar armas nucleares. Muita coisa estranha aconteceu e acontece em sua biografia, mas essa é demais.
Por sua vez, o candidato tucano também jamais se imaginou diante daquela feia estátua do Padim Ciço, fazendo o sinal-da-cruz e ouvindo os "benditos" dos devotos. Nem Gláuber Rocha, em seus mais formidáveis delírios, teria imaginado tal e tanto. Ora, direis, são abrolhos da campanha. Pior mesmo é a hora da verdade, a hora da maionese. Aquela maionese engordurada, cardápio obrigatório de nove entre dez refeições das andanças eleitorais.
Dizer que política é a arte de engolir sapos não passa de sovada hipérbole. Política é a necessidade de engolir as maioneses da campanha e a elas sobreviver, com o colesterol indo para o diabo. Dependendo do auditório, prometer artefatos nucleares e ouvir "benditos" até que é mole. Agora, desprestigiar a maionese preparada pela mulher do dirigente local é letal em vários sentidos.

Texto Anterior: Não às pressões
Próximo Texto: Como prejudicar seu candidato
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.