São Paulo, sábado, 14 de maio de 1994
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A seleção dos reservas é superofensiva

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, vendo a festa esmeraldina, recordo os versos do "Romance Sonambulo" de Federico García Lorca:
"Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña."
Vencidas as suas lutas domésticas, só falta ao Palmeiras, agora, cavalgar na cordilheira pela conquista da América. E depois lançar o barco no oceano para singrar os sete mares.
Que tal – só para dividir o coração do Clóvis Rossi – um Palmeiras X Barcelona disputando o mundial de clubes, no final do ano, lá na Terra do Gol Nascente?
*
A seleção convocada por Carlos Alberto Parreira é um daqueles casos de tese irmã siamesa da sua própria antítese. No verso, uma teoria, no reverso, a contrateoria.
Seria o caso de se pensar em um Parreira e seu Duplo? Em um Parreira e o seu Outro? Em um Parreira mais complexo, mais dividido, e neste sentido, literariamente mais intrincado?
Eu só não diria que é um caso de heterônimos porque o Parreira não criou outros nomes para si mesmo ao convocar as suas duas – isto mesmo, duas – seleções diferentes e opostas.
(Aviso que não penso na hipótese de uma seleção do Parreira e outra do Zagalo. Seria jogo de duplicidade labiríntica, e nós sabemos o quanto é difícil ganhar um jogo desses, que dirá uma Copa).
Pense no time reserva (entre aspas) brasileiro. Ele teria Zetti no gol, um goleiro que se especializou em iniciar jogadas rápidas de contra-ataques, muitas delas resultando em gols do São Paulo.
Nas laterais, Cafu e Leonardo, dois azougues quando se trata de municiar o ataque dos times que defendem.
Um meio-campo composto por Mazinho e Paulo Sérgio (cadê os chamados destruídores, os cabeças-de-área de marcação forte – que todo mundo diz hoje que são fundamentais?)
E uma linha de três atacantes, Ronaldo, Viola e Muller. (O 11.º jogador é um goleiro, o Gilmar. Mas, mesmo com ele atuando fora do gol, não sei não se o time B não bate o suposto time A. A conferir).
Alguém pode imaginar um time mais ofensivo? Alguém poderia suportar que este seria o time reserva de uma seleção que joga com apenas dois cabeças-de-área e dois atacantes?
(Disso tudo se pode concluir que a escolha de Dunga é muito mais em função das características técnicas e psicológicas do jogador do que propriamente pelo apego ao esquema tático de Parreira.
Se a questão fosse tática, o correto seria, sem dúvida, levar César Sampaio, que tem perfil técnico mais próximo do Dunga. Nem Mazinho, nem Cafu, reservas, são destruidores fortes como Dunga).
Meu amigo, meu inimigo, imagine o seguinte cenário: Mauro Silva machuca-se no primeiro jogo e Dunga é suspenso devido a uma entrada violenta no adversário. Quem entra no lugar deles?
Em tese, Cafu e Mazinho. Então quem vai ser o destruidor? Quem vai ser o desmancha-prazeres? Quem vai ser o marcador duro? Ambos são mais refinados e também mais iniciadores de jogo.
Com o duo Cafu-Mazinho acaba o conceito de uma dupla de cabeças-de-área que joga à maneira Rambo. E acaba todo o princípio defendido pela própria comissão técnica até agora.
Temos então duas seleções com princípio de jogos diferentes. É possível se pensar em um Parreira contra Parreira? Espero que sim, sinceramente.

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