São Paulo, terça-feira, 24 de maio de 1994 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Passeio a Paquetá
ANTONIO CARLOS DE FARIA RIO DE JANEIRO - Golfinhos de uma nova espécie estão adentrando a baía de Guanabara, informa a edição de ontem de "O Globo".Já os vi, não sei se da nova ou de espécie tradicional, quando uma vez tomei a barca na praça 15 e fui à ilha de Paquetá. Ver os golfinhos, embalado pela morosidade da embarcação, deixou-me surpreso, pois não os imaginava com a capacidade de sobreviver nas poluídas águas da baía. Esse é um dos vários passeios do Rio que trazem evocações de um passado não tão distante, mas que parece irremediavelmente dissociado do presente. A começar da praça, antigo cais Pharoux da colônia e do Império, onde por dois séculos o mundo se comunicou com o Brasil. Tudo chegava ou saía do país sob as sombras do chafariz do Valentim ou do Paço Imperial. Hoje as sombras vêm do elevado que encobre e torna feia toda a extensão da avenida do porto. Tal qual o Minhocão paulista, a avenida Perimetral tem o perfil pragmático dos anos em que qualquer obra era válida, mesmo que comprometesse para sempre o desenho de uma cidade. Mas os golfinhos não são vistos nas proximidades do cais. A poluição da baía parece mais crítica nas suas bordas. No entanto, é fácil avistá-los no meio do percurso de 40 minutos até Paquetá. Não foi sempre assim. Há mais de 20 anos, os golfinhso também cercavam as barcas no trajeto, menor, entre Rio e Niterói. Essas cenas não vi e as conto conforme a descrição de um amigo. Segundo suas memórias, os golfinhos eram tão comuns que passaram a fazer parte do brasão de Guanabara, o antigo distrito federal do país. Relatos dos séculos 18 e 19 mostram que outros cetáceos também frequentavam a baía e eram massacrados para satisfazer ao consumo de carne e óleo da época. A caça às baleias tingia com sangue as águas das praias do Flamengo e de Botafogo, conforme retrata uma das telas do Museu Nacional de Belas Artes, da qual não me lembro o autor. A presença dos golfinhos na baía deixa a sensação de algo que está onde não deveria estar. Algo tão deslocado quanto a miséria dentro da rica paisagem do Rio. Texto Anterior: Sindicalismo eleitoral Próximo Texto: Problema número um Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |