São Paulo, segunda-feira, 30 de maio de 1994
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Fernando Lula Cardoso da Silva

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - Sejamos francos, candidato em campanha é como milionário coroca com namoradinha nova a tiracolo: está sempre na fronteira entre o ridículo e o patético. Diga a verdade: é ou não é? Pode dizer.
O candidato, você sabe, é aquele cidadão que, podendo exibir ao eleitor as próprias virtudes, prefere denegrir supostos dotes do adversário ou atribuir-se qualidades que não possui.
Note-se, a propósito, o que se passa com dois de nossos impolutos candidatos à Presidência. Falo de Fernando Henrique Cardoso, o sociólogo, e de Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-operário.
Ambos se esforçam para parecerem o que não são. Creia-me, leitor, se não fosse candidato, Fernando Henrique, nosso vaqueiro da Sorbonne, jamais derreteria o solado no chão tórrido de Delmiro Gouveia (AL).
Não sei se fui claro: seria mais fácil um pinguim cruzar três Saaras do que FHC comer carne de bode espremido a um magote de sertanejos suados. Compreendeste? Não fosse a eleição, d. Luciano Mendes teria de negar Cristo três vezes para que nosso senador empuleirasse no lombo de um cavalo, envergando aquele chapéu de cangaceiro.
O caso de Lula é semelhante. O candidato do PT bateu na trave em 89. Agora imagina que é chegado o momento. Sente o bafejar da sorte a acariciar-lhe a cara.
Pois bem: tido como lobo mau, habituado a atemorizar os latagões do empresariado, Lula porta-se agora com modos de cordeiro. Enquanto Fernando Henrique come costela de bode no sertão, Lula divide salões acarpetados e mesas de restaurantes finos com homens de negócios.
Apesar do esforço, Fernando Henrique não chega a ser um bamba na comunicação com o eleitor da feira de Caruaru (PE). Súbito, descobriu que os ensinamentos de Hannah Arendt não são tudo na vida. Às voltas com seu sotaque de porta de fábrica, Lula também fez uma fantástica descoberta: o Brasil é maior do que o sindicalismo do ABC paulista.
Eis, para arrematar, a mais pura, a mais santa, a mais imaculada verdade: embora um esculhambe o outro, Fernando Henrique quer ser Lula e Lula deseja ser Fernando Henrique. Em suma: temos dois candidatos-mendigos. Ambos correm o pires. Um implora por popularidade. O outro suplica por respeitabilidade. Falta-nos o candidato inteiro, completo.

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