São Paulo, quinta-feira, 2 de junho de 1994
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As minhas despedidas

TASSO JEREISSATI

Depois de um ano e meio escrevendo às quintas-feiras nesta coluna, vejo-me obrigado a me despedir dos leitores deste jornal em função de minha candidatura ao governo do Ceará. Neste período, tive uma das experiências mais ricas e gratificantes que um homem público pode ter. A oportunidade que esta Folha me ofereceu de ter um espaço nobre para expor minhas idéias com liberdade, sem limitações de qualquer ordem, recebendo de seus leitores –e até mesmo de seus articulistas– o retorno em forma de críticas, apoios e estímulos, foi realmente um privilégio raro, singular.
Mesmo correndo o risco de cair na pieguice, não posso, entretanto, deixar de registrar nesta coluna os agradecimentos aos leitores e à Folha, esperando que tenhamos nova oportunidade para um reencontro.
Lamento que, nesta oportunidade, não possa comemorar o reencontro do Congresso Nacional com as aspirações do país. Seu trabalho na reforma constitucional foi melancólico, pois marcado não apenas pela indiferença com os maiores interesses da nação, mas também maculado por uma enorme tibieza, que foi a desestruturação de seu trabalho por uma minoria inexpressiva que, através de um trabalho aguerrido, foi capaz de curvar uma maioria de vontade fraca, sem firmeza para fazer prevalecer os interesses maiores da nação.
Com certeza, o tema mais batido e repetido neste espaço –às vezes até de uma forma cansativa– foi a necessidade de uma reforma profunda do Estado brasileiro. A afirmação de que o Estado brasileiro é falido e inoperante, que deixou de servir ao cidadão brasileiro, não é minha. É uma constatação da sociedade. Por outro lado, a avaliação de que este Estado ineficiente é a raiz da inflação e, sem combate à inflação, não há combate eficaz à miséria e à fome, também hoje tornou-se quase um consenso.
A revisão constitucional era o pressuposto inadiável para o início destas transformações que incluiriam também as reformas nas estruturas políticas –estruturas estas, arcaicas, que tantas vezes aqui foram apontadas como responsáveis pela paralisia da administração pública.
Infelizmente, não houve revisão constitucional. Com o seu fim, foi-se também a última esperança de que o Congresso Nacional retomasse sua credibilidade junto à opinião pública.
Se nesta legislatura naufragaram tantas expectativas, graças a Deus estamos às vésperas de eleições gerais. As esperanças podem se reacender.
Que da decepção profunda causada na última eleição presidencial, quando Fernando Collor teve a incrível capacidade de frustrar toda a nação, até a decepção do Congresso Nacional, que se mostrou totalmente desrespeitoso aos sentimentos da opinião pública, seja tirada a grande motivação para as próximas eleições.
O Brasil não suporta mais salvadores da pátria nem pode ser laboratório de experiências milagrosas –causadores de tantos males a este país durante anos a fio. O que fazer, já se sabe: não existem mágicas. Como fazer, também: é preciso um presidente responsável, que tenha história e a capacidade de governar, gerenciar e implementar estas mudanças num ambiente de normalidade democrática. É preciso, também, um Congresso responsável. Está mais do que comprovado: o voto dado ao deputado e ao senador é tão importante quanto o voto dado ao candidato a presidente e a governador.
Nossa história recente tem mostrado com clareza que não existe governo dinâmico, capaz de fazer as mudanças, sem apoio do Congresso que garanta a governabilidade e as transformações.

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