São Paulo, terça-feira, 7 de junho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tempo para consertar

ALBERTO HELENA JR.

Saímos do hotel, em Edmonton, no Canadá, lá pelas quatro e meia da madrugada, numa viagem tortuosa, com parada em Salt Lake City, para chegarmos a Los Gatos, Califórnia, EUA, por volta do meio-dia daqui, posto que uma hora se perde (ou se ganha, já nem sei mais se é pra frente ou se é pra trás, pois só sei que meu fuso entrou em parafuso).
Acompanhava-me a expectativa de que encontraríamos uma seleção efervescente. Afinal, o mundo todo se diz decepcionado com o futebol apresentado pelo Brasil neste domingo.
Nada disso, nem de longe. No gramado que separa o hotel Villa Felice do estacionamento de carro permitido à imprensa, logo de entrada, foi armado, literalmente, um circo.
Explico: trata-se de uma lona montada em forma de circo (ou, se quiserem, dos templos evangélicos nos anos de recessão por aqui), com cadeirinhas de plástico formando um auditório em frente a uma bancada, atrás da qual Parreira dava sua entrevista coletiva.
Aliás, um Parreira loquaz como sempre e com uma clara expressão de confiança estampada no rosto.
"Estaria preocupado –me dizia, depois da coletiva, num canto– se tivéssemos empatado com o Canadá da mesma forma que o Marrocos, que não chegou à área canadense nem uma vez sequer. Nós, não. Nós perdemos uns sete gols, pô!"
É verdade, perdemos muitos gols, cara-a-ara com o goleiro. E o pior: com jogadores que são exímios finalizadores, como Romário e Bebeto. Por quê?
Segundo Romário, em torno do qual, mais adiante, formava-se uma rodinha de microfones, apenas por falta de concentração.
Romário –pasmem!– não culpa ninguém a não ser ele mesmo e seu companheiro Bebeto pelos gols desperdiçados, e, consequentemente, pelo empate com a seleção do Canadá.
Bom, muito bom mesmo, quando uma estrela da cintilância de Romário e do intempestivo temperamento do nosso artilheiro, assume publicamente a culpa por um resultado negativo. Isso quer dizer que sempre haverá tempo e jeito para consertar as coisas.

Para o próximo amistoso, contra Honduras, Parreira está disposto a testar mais uma vez Mazinho no meio-campo. Outra boa notícia. Afinal, o próprio técnico admite que o jogo contra o Canadá foi atípico, por causa da cerrada marcação dos adversários nos primeiros 20 minutos de jogo.
E, sobretudo, porque as alterações subsequentes –Paulo Sérgio e Cafu– acabaram por desfigurar o time. É preciso, pois, ver com mais atenção como Mazinho se comportará nesse meio-campo, mas com o resto do time titular.

Ainda ontem, aqui em Los Gatos, o principal assunto era o Brasil à procura de um capitão. Menos mal que não esteja à procura de um general, espero, com todo o respeito que os generais merecem.
Fico pensando se a escolha do capitão do nosso time (Jorginho, Ricardo Rocha, Raí e Dunga participam de um revezamento) tem mesmo a importância que se lhe confere aqui em Los Gatos.
Capitão mesmo, com voz de comando e atuação dentro das quatro linhas, eram Charles Miller, Rubens Salles, Amilcar Barbuy, os heróis já esquecidos dos tempos pioneiros do futebol no Brasil.
Então, eles eram um misto de treinador, porta-voz dos companheiros e tinham verdadeiro poder de comando, pois as leis do jogo assim permitiam.
Nos tempos modernos, o capitão, na verdade, está lá só pra acompanhar o ritual da moedinha ser jogada ao ar, para escolher o campo.
O que me surpreende é Parreira, que convive há três anos com esse grupo de jogadores, ainda ter dúvidas sobre qual o mais habilitado a vestir a braçadeira de capitão. Convenhamos, é muito.

Texto Anterior: O RANKING DO TÊNIS
Próximo Texto: Maradona treina e recupera a forma
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.