São Paulo, domingo, 12 de junho de 1994
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Estamos ficando malucos ?

GILBERTO DIMENSTEIN

Estamos ficando malucos?
BRASÍLIA – Para medir a taxa de insanidade nacional, basta ver a reação diante da revelação da Igreja Católica, indicando através de detalhada pesquisa em mais de 2.000 municípios aumento da mortalidade infantil.
Do Palácio do Planalto, onde trabalha um presidente que se diz preocupado com o "social", veio um tímido e protocolar pedido de explicações ao Ministério da Saúde -e o Ministério da Saúde tenta desmerecer a descoberta. Afinal, a amostragem ocorreu em "apenas" 1,3 milhão de famílias, acompanhadas diariamente.
Fosse uma denúncia de corrupção, viria uma reação espalhafatosa pelo menos para dar satisfação à opinião pública. A insanidade se esconde num fato: a nação se comove hoje mais, muito mais, com corrupção do que com mortalidade infantil, provocada por doenças facilmente evitáveis.
Não existe nenhum indicador mais grave do que a mortalidade infantil. Por aí se mede uma cadeia de fracassos: da nutrição, passando pela falta de saneamento básico, da educação até o sistema público de saúde.
Tradução da pesquisa: a sociedade brasileira está fracassando na sua mais elementar tarefa de garantir a vida dos mais frágeis, apesar de deter meios e tecnologia suficientes na área de saúde. E não é um fracasso apenas do governo, mas de toda uma elite.
A imensa maiora das pessoas não sabe, mas chegamos ao cúmulo de registrar redução na vacinação: no ano passado, 2 milhões de crianças não vacinadas. Apenas cinco capitais (repito cinco) atingiram a meta mínima de 90% de crianças vacinadas. E, aí, não estão São Paulo, Rio de Janeiro ou Belo Horizonte. Já chegamos, em 1992, a atingir 97% da meta.
Muitas vezes, a melhor forma de esconder o drama humano é através das estatísticas. Vamos traduzir: se confirmada a tendência verificada pela Pastoral de aumento de 15% na mortalidade, isso significaria que, a cada hora, morreriam mais quatro seres antes de completarem um ano. Repito: quatro a cada hora.
E por um único motivo: leviandade.

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