São Paulo, sexta-feira, 17 de junho de 1994
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"Os Novos Monstros" ri da desgraça

FEDERICO MENGOZZI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Título: Os Novos Monstros
Direção: Dino Risi, Ettore Scola e Mario Monicelli
Elenco: Vittorio Gassman, Ornella Muti, Ugo Tognazzi, Alberto Sordi
Produção: Itália, 1977
Onde: Liberty

Nos anos 60, a moda dos filmes em episódios era uma das coqueluches –doença ou hábito– do dinâmico cinema italiano, uma máquina "arrebataprêmios" que ainda não tinha perdido o seu público. Não era nenhuma novidade e datava pelo menos de 1916, quando o pioneiro David W. Griffith queimou US$ 2 milhões e fez avançar a linguagem do cinema nos cinco episódios de "Intolerância".
"Os Novos Monstros", dirigido por Mario Monicelli, Dino Risi e Ettore Scola em 1977, é um filme duplamente temporão. Produzido quando ninguém mais pensava em reunir curtas-metragens para compor um longa-metragem, apesar da reincidência recente de "Contos de Nova York" e "Sempre aos Domingos", chega aos cinemas depois de 17 anos. E, no entanto, vale recuperar o atraso. O filme está fresco e saltitante.
É a típica comédia italiana em nove episódios ligados a comportamentos e problemas da sociedade contemporânea. Ri-se muito, pensa-se outro tanto e, sobretudo, percebe-se o quanto a espécie é engraçada quando se leva a sério demais. Povo solar, os italianos têm subjugado os seus subjugadores através da capacidade de rir de si mesmos, e deles.
O primeiro episódio prova que, ao invés de gastar uma hora e 30 minutos para mostrar a força da Igreja conservadora, bastam alguns minutos.
O carro de um membro do clero (Vittorio Gassmann) quebra na periferia. Ele procura a igreja local e se depara com uma reunião dos moradores, que reivindicam casa e melhores condições de vida, coordenada por um membro da nova Igreja. Velha raposa, com dois ou três movimentos reconduz as "ovelhas" ao rebanho do Senhor.
Na mesma linha sintética, nem sempre com igual maestria, desenrolam-se outras histórias morais. Como a do grão-fino ligado à direita que é obrigado a atender uma vítima de atropelamento e do filho cinquentão que leva a mãe para conhecer um asilo para idosos –ambos interpretados por um Alberto Sordi pouco empenhado. Ou a história da cantora de província agenciada pelo marido inescrupuloso (Ugo Tognazzi). Seria cômico, se não fosse trágico.
Aos 22 anos, Ornella Muti passeia sua "travolgente" (arrebatadora) beleza em dois episódios de enganos que terminam tragicamente. No primeiro, é a moça que pede carona a um conquistador barato; no segundo, apaixona-se por um tipo de sorriso angelical e intenções nem tanto. Cobrar desempenho daqueles olhos e daquele sorriso? Ornella é de fechar o comércio, a indústria e todo o setor de serviços.
"Os Novos Monstros" inclui ainda um episódio telegráfico sobre um atentado mafioso, um hilariante momento de pastelão passado na cozinha de um restaurante ao qual chega "Gianni Agnelli" e fina companhia e o "grand finale", com Sordi agora empenhadíssimo, à beira de um túmulo. O episódio final serve como síntese do espírito da comédia italiana e universal, que é rir mesmo, e principalmente, na tragédia.
O título se refere a "Os Monstros", de 1963, filme de sucesso que Dino Risi rodou com Gassman e Tognazzi pouco depois de "Aquele que Sabe Viver", sua obra-prima. Mas "Os Novos Monstros" não é, a rigor, uma sequência. No final dos anos 70, Mario Monicelli e Risi eram nomes afirmados, e Ettore Scola mostrava que vinha para ficar na primeira fila do cinema europeu.
O filme em episódio está para o cinema como o livro de contos está para a literatura. Quem aceitar seus limites, como a irregularidade, terá suas qualidades, como a diversidade, e vai se divertir.

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