São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Morte de ianomâmis é mistério após 1 ano

ANDRÉ LOZANO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

Passados 11 meses da morte de 16 índios ianomâmis na aldeia Haximu (Venezuela), em julho de 1993, ninguém está preso e a Polícia Federal não consegue localizar os acusados nem as testemunhas de acusação e defesa.
Foram denunciados à Justiça 24 garimpeiros, dos quais apenas sete com nome completo e endereço. Os outros 17 são identificadas por apelidos como "Goiano Doido", "Paraná Aloprado", "Uriçado" e "Ceará Perdido".
A terceira audiência judicial do caso está marcada para 6 de julho. Ministério Público, Polícia Federal e Funai (Fundação Nacional do Índio) se responsabilizam mutuamente pela não-localização dos acusados.
Pela primeira vez desde o massacre, o superintendente da Polícia Federal em Roraima, delegado José Sidney Veras Lemos, admite que tem "dúvidas do número de mortes".
Lemos foi responsável pela condução da primeira parte do inquérito sobre o caso.
Apenas um corpo foi achado. O advogado dos garimpeiros, Eliodoro Mendes, diz que não há provas materiais. As cinzas do que seriam os outros corpos estão em cabaças guardadas pelos ianomâmis.
A posição oficial da Justiça é de não requisitar as cinzas para exame, que poderia comprovar se são mesmo humanas.
A Constituição (art. 231) assegura o respeito às tradições indígenas, e os ianomâmis lacram as cabaças e consomem as cinzas em rituais anuais (veja texto à pág. 1-19).
O juiz federal de Manaus Marcos Augusto de Souza diz que, se isso fosse considerado essencial, a Justiça poderia alterar a decisão.
A localização dos acusados e testemunhas é o problema mais imediato da Justiça.
O procurador da República em Roraima, Franklin Rodrigues da Costa, afirma que o Ministério Público "está fazendo o possível para cumprir o seu papel".
"O que nós achamos é que o Ministério da Justiça, através da Polícia Federal, não está se empenhando em oferecer apoio logístico para trazer as testemunhas e acusados", diz Costa.
Ele diz que o Ministério Público tem atribuição técnica, ou seja, deve juntar as provas necessárias à condenação dos réus.
O procurador diz que a responsabilidade pela localização dos envolvidos é da Polícia Federal.
A Polícia Federal alega que o Ministério Público foi impreciso na denúncia porque informou apenas os apelidos da maioria dos acusados, o que dificulta a localização deles.
"Eu vou ser sincero, vai ser difícil encontrar os garimpeiros. Em um garimpo onde trabalham 5.000 homens existem pelo menos 30 garimpeiros com apelido de Parazinho, por exemplo", afirmou o delegado Lemos.
A Justiça Federal expediu mandados de prisão contra todos os garimpeiros acusados. O superintendente da PF disse que os recursos para operação são poucos.
"A Aeronáutica tem um helicóptero em Boa Vista (RR), mas ele se acidentou. A Funai também tem um, mas é muito pequeno. Não tem como a Polícia Federal entrar nos garimpos para buscar essas pessoas", diz Lemos.
"Os denunciados estão sendo processados. Aparecendo ou não, eles serão condenados e perseguidos enquanto o crime não prescrever", afirma o procurador Franklin Costa.
Segundo ele, o crime de genocídio prescreve em 20 anos. A pena é igual à de homicídio e varia de 12 a 30 anos.
A Funai afirma que falta determinação na atuação da Polícia Federal.
O advogado dos garimpeiros afirma que alguns dos acusados estão em Boa Vista. Outros, segundo ele, trabalham em fazendas próximas à cidade.

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