São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Ianomâmis vão ingerir cinzas dos mortos

CLAUDIA VARELLA
DA AGÊNCIA FOLHA

Claudia Andujar, coordenadora geral da CCPY (Comissão pela Criação do Parque Yanomami), diz que as cinzas dos ianomâmis mortos na chacina estão guardadas com suas famílias.
Ela afirma que não viu as cinzas porque estão lacradas dentro de cabaças. Essas cabaças são abertas somente em rituais.
Segundo ela, as cinzas são provas da chacina de 16 índios ianomâmis em julho de 1993, na aldeia Haximu, no lado venezuelano da fronteira com o Brasil.
Segundo ela, depois da cremação dos corpos, os restos dos ossos foram amassados até virar pó. As cinzas serão ingeridas em rituais durante três anos, afirmou.
Ela não sabia dizer quantas cabaças foram abertas até agora pelos ianomâmis.
Sobre a possibilidade de a Polícia Federal apreender essas cabaças para investigação, Claudia diz que isso seria um crime "maior que a própria chacina".
"O ritual de ingerir as cinzas de seus mortos para adquirir suas virtudes é sagrado para os ianomâmis. Violar essa cultura seria uma agressão", afirma.
Ela diz que, dos 16 mortos na chacina, 14 foram cremados pelos ianomâmis. "Um corpo não foi encontrado e outro não foi cremado", disse.
Segundo ela, o corpo que não foi cremado era de uma mulher que não tinha parentes na tribo Haximu. "Os corpos só podem ser cremados pelos parentes".
A ossada dessa mulher, apreendida pela Polícia Federal, está no IML (Instituto Médico Legal) em Brasília.
A coordenadora da CCPY disse que os 76 sobreviventes do massacre de Haximu estão morando na maloca do Makos, na região do rio Toototobi (AM), próximo à divisa com Roraima.
"Os sobreviventes estão construindo nova maloca (casa comunitária) próximo ao Makos", afirma. Segundo ela, moram numa maloca de 35 a 70 índios.
Claudia disse que faz parte da cultura deles abandonar um local depois de algum acontecimento grave ou epidemia. "Haximu não traz mais segurança para eles".
A CCPY em Boa Vista (RR) registrou este ano 72 mortes por malária em Toototobi. Três das vítimas eram de Haximu.
A coordenadora disse que a CCPY desenvolve projetos de saúde e de educação com os ianomâmis desde 1979.
Segundo ela, a entidade recebe verbas de governos estrangeiros e do Brasil. Claudia não quis dizer o total de recursos.

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