São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Um nasce para sofrer enquanto o outro ri

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DA REVISTA DA FOLHA

Uma Copa do Mundo jamais abolirá o acaso. E este "hasard", que rege o lance de dados e o lance de bola, tem sido até aqui um aliado do futebol brasileiro para dobrar a rigidez pouco imaginosa de Parreira na hora de escalar sua seleção.
A começar pelo que hoje seria inconcebível, mesmo para aqueles que preferem exaltar o "grande caráter" e o "homem" às virtudes técnicas do craque de futebol: não fosse pela contusão de Muller, nas eliminatórias, e Romário, esse primor de atacante, não estaria entre os convocados.
Se escalar Romário foi a mais valiosa contribuição do destino, não se pode minimizar a mudança, para melhor, da ala esquerda, com Leonardo e Márcio Santos em lugar de Branco e Ricardo Gomes, um em má forma física, outro cortado por distensão muscular.
Como diz a bola cantante Tim Maia, na vida a gente tem que entender que um nasce pra sofrer enquanto o outro ri.
E rir é o que os brasileiros querem fazer amanhã. Numa comparação com 90, o Brasil entre em campo contra a Rússia mais bem preparado e com melhores jogadores do que na partida contra a Suécia, em Turim.
É verdade que não temos um brilhante meio de campo –mas ainda assim, Dunga, Mauro Silva e Raí levam vantagem sobre Dunga, Alemão e Valdo. Livres da figura do líbero, temos agora mais um jogador ocupando a faixa intermediária, Zinho. Não são quatro ases, mas se o curinga da sorte ajudar, podem render um bom futebol.
Na frente, Bebeto e Romário formam uma dupla superior e em melhor forma do que Careca e Muller em 90. Já naquela época, o duo atual mostrou-se, na conquista da Copa América, mais eficiente. Mas Romário machucou-se e Lazaroni resolveu barrar Bebeto. Perdido o Mundial, ouvi do treinador, em Milão, que "aquele time" (o da Copa América) "foi melhor" (que o da Copa).
A defesa praticamente se equivale a de Lazaroni. É mais leve, contudo. E com um lateral, Leonardo, mais inclinado ao ataque. Taffarel... bem, espero que não joque com fome.
Mas o xis do problema é o seguinte: a seleção jogará solta, com trocas de posição, mobilidade e mudanças de ritmo ou, como fez em muitos amistosos, terá um comportamento de aluno de escolinha tentando repetir a tabuada? O jogo vai fluir ou se prenderá ao esforço esquemático para reproduzir jogadas de treino tático, com o time amarrado a situações predeterminadas?
Se a resposta for sim para o jogo fluente, não há erro: o Brasil é favorito para vencer a Copa. Caso contrário, será um time de cartas marcadas, travado e fácil de ser anulado por adversários determinados e disciplinados.

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