São Paulo, quarta-feira, 22 de junho de 1994
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Rock alternativo respira com Second Come

MARCEL PLASSE
DA REPORTAGEM LOCAL

O rock carioca é um monstro mutante. Representando duas gerações da espécie, o segundo álbum do grupo Second Come e o primeiro disco solo de Tony Platão, ex-Hojerizah, são como os proverbiais água e vinho.
Platão vem da ilusão perdida do Plano Cruzado, do inchaço e implosão de 86-87, período em que mais se lançou discos de rock no país. Second Come nasceu sem futuro, em plena recessão de 90.
As safras diferem em tudo. Platão tem grande gravadora nas costas e um disco que não incomoda.
Second Come é outra novela. Nenhuma grande gravadora brasileira apostaria num grupo como Second Come. A banda canta em inglês, não faz "mangue beat", "forró-core", metal, rap ou pop romântico.
O disco "Superkids, Superdrugs, Supergods and Strangers" é o quinto lançamento do selo Rock It!, um dos mais alternativos e quebrados do país.
Os proprietários do selo são veteranos da luta dos anos 80: Dado Villa-Lobos, do Legião Urbana, e André X, do Plebe Rude.
Não é difícil ver a afinidade entre Dado, que co-produziu o disco, e Second Come. Uma das influências da banda é Joy Division, grupo que marcou, antes da fase Smiths, os discos do Legião.
A lista de influências básicas tem ainda Pixies, The Kinks, Jesus and Mary Chain, Spacemen 3 e Ride. Com a exceção do Pixies, grupos ingleses.
Mas a obviedade passa longe da banda. A música "She Could Melt the Sun", por exemplo, soa como uma jam entre Jesus and Mary Chain e Kiss.
"Superkids, Superdrugs, Supergods and Strangers" é um disco de fãs, de ratos de lojas importadoras de CDs. Não é todo mundo que cita Stereolab numa lista de afinidades –e tem Stereolab na lata de uma música do disco.
Second Come representa bem o que virou o rock independente no país: bandas à margem do marketing agressivo das grandes gravadoras, do interesse em modismos da imprensa e até da programação das chamadas "rádios rock".
"Nossa geração é independente não só no sentido da produção, mas também na ideologia", diz Fábio Leopoldino, cantor, guitarrista e compositor da banda. "A gente não grava pensando em estourar, mas em fazer o que gosta."
Não quer dizer que a música seja muito complicada, difícil de gostar. Ao contrário, é simples, com refrões fáceis de seguir e assobiar. Esta é a grande virtude de Fábio Leopoldino.
Há dois anos, uma fita demo da banda caiu nas mãos de Everett True, o mais famoso crítico musical inglês. O jornalista babou.
Mas pouco se falou no Brasil do primeiro disco, "You".
Agora, "Superkids, Superdrugs, Supergods and Strangers", abusa da facilidade em compor músicas com ganchos melódicos irresistíveis.
O "hit" é "It's Wrong", com bateria eletrônica sampleada. O CD tem um remix ainda mais dançante, com vocal invertido e ligeiro clima de "ambient house".
O disco vem cheio de participações especiais da cena "alternativa" carioca. Simone, do grupo Dash, faz vocais em "Little Friend", e a ninfeta Daniela, vocalista de 15 anos do grupo Number Four, canta uma faixa sem nome. O novo baterista, Reyson, vem do grupo Cactus Cream.
Apesar do Rock It! ter acordo de distribuição com a EMI –graças à participação de Dado no selo–, Second Come deve ser, novamente, candidato a melhor disco pouco ouvido do ano.

Disco: Superkids, Superdrugs, Supergods and Strangers
Grupo: Second Come
Gravadora: Rock It!
Preço: 18 URVs

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