São Paulo, quinta-feira, 23 de junho de 1994
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Francês ataca estrangeiros e propõe guetos

ANDRÉ LAHOZ
DE PARIS

O francês Jean-Marie Le Pen, presidente da Frente Nacional (FN), criada em 1972, é a maior expressão do fascismo na França e uma das maiores lideranças de extrema direita do continente, como o russo Vladimir Jirinovski e o italiano Gianfranco Fini.
O discurso de Le Pen guarda muitas semelhanças com o discurso nazista. Em primeiro lugar, é fortemente nacionalista e apela para o "orgulho ferido" francês.
O seu programa de governo se intitula "O renascimento da França", no qual promete a volta dos dias de glória do país no mundo.
Há também a figura do "bode expiatório", responsável pelos grandes problemas do país –como o foram os judeus para os nazistas.
Para Le Pen, os estrangeiros que moram na França poluem a cultura francesa e explicam boa parte das altas taxas de desemprego no país.
Le Pen ficou famoso por discursar: "Para 3 milhões de franceses desempregados há 3 milhões de estrangeiros trabalhando".
"Assim como não podemos misturar petróleo e trigo em um navio, não podemos misturar diferentes raças. A compartimentação do mundo é algo necessário."
Candidato à Presidência nas eleições do ano que vem, promete acabar com a imigração no país.
Além da expulsão dos estrangeiros, Le Pen tem outras propostas polêmicas. É a favor da obrigatoriedade do exame de Aids para todos os habitantes do país.
Chegou a propor a criação de uma espécie de gueto, um centro para isolar pessoas contaminadas pelo vírus. Foi acusado de tentar recriar os campos de concentração nazistas, coisa que nega violentamente, assim como qualquer outra semelhança com Hitler.
Ataca também os defensores dos direitos humanos, que "paralisam a nossa sociedade".
Esse discurso xenófobo e racista tem encontrado respaldo. Em 1992, a Comissão Nacional dos Direitos do Homem realizou uma pesquisa que mostrava que 62% dos franceses se diziam atraídos por algumas idéias racistas.
Analistas políticos são unânimes em afirmar que a FN parece ter se cristalizado como partido político.
Apesar de nunca mais ter repetido o resultado da eleição presidencial de 1988, na qual Le Pen obteve 14,57% dos votos, a FN tem sistematicamente registrado votações superiores a 10%.
Seus eleitores são pessoas de baixa renda, que sofrem mais com a atual situação econômica do país e que por isso estão mais abertos a aceitar um discurso como o da FN. Le Pen afirma dizer "em voz alta o que todos pensam baixo".
Há quem afirme que o partido parou de crescer porque o atual governo Balladur teria encampado parte das idéias de Le Pen.
O ministro do Interior, Charles Pasqua, é autor da lei que restringe a entrada de estrangeiros no país.
Le Pen não aceita essa explicação. Afirma que o partido é vítima de uma campanha de "apartheid" da mídia, que se recusaria a noticiar os atos do partido.
A FN rejeita ações violentas de grupos de jovens extremistas. Afirma que qualquer membro do partido será expulso se for comprovada participação nesses grupos. Não quer perder a legitimidade política conquistada ao longo dos anos.
Esse grupos têm ação muito menos importante do que em países como a Alemanha. Os franceses não têm estética que os diferencie obviamente dos outros jovens.
"Eles podem estar sentados em qualquer universidade e ninguém nunca perceber", afirmou à Folha Marie Bocard, da SOS Racismo.
Os poucos ataques realizados por esses grupos costumam se limitar a cemitérios judaicos ou placas homenageando antigos heróis da Resistência francesa.
São atos considerados muito distantes dos incêndios contra abrigos para estrangeiros provocados por skinheads alemães.

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