São Paulo, sexta-feira, 1 de julho de 1994
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Paquistanês quer emocionar com música sufista

SÉRGIO MALBERGIER
DE LONDRES

Nusrat Fateh Ali Khan é um dos artistas mais populares do Paquistão. Ele chega hoje ao Brasil para mostrar pela primeira vez ao país o Qawwali, uma música mística e devocional do sufismo, ramo místico do islamismo (ver texto ao lado).
Nusrat se apresenta no Festival de Inverno de Campos de Jordão este final de semana e dá um show também no campus da USP na semana que vem.
Ele divide o palco com mais dez pessoas –duas tocam harmônio (pequeno órgão), uma toca tabla e sete batem palmas.
Seus shows não têm tempo definido de duração. Em Londres, anteontem, durou mais de três horas.
Nusrat, de chinelo e moleton, com colares grossos de ouro pendurados no pescoço gordo, falou à Folha ontem em Londres, com o auxílio de um intérprete, sobre sua música e a viagem ao Brasil.

Folha - O sr. será o primeiro cantor Qawwali a se apresentar no Brasil. Qual são suas expectativas?
Nusrat Fateh Ali Khan - Espero que as pessoas gostem e sintam a emoção que expresso em minha música.
Folha - O que o sr. sente quando está cantando?
Nusrat - Me sinto num mundo diferente, em conexão com Deus. A música Qawwali é sagrada. Não se pode cantá-la em bares, clubes. É uma música religiosa.
Folha - O Qawwali é muito tradicional. O sr. sente vontade às vezes de experimentar novos tipos de música, instrumentos modernos?
Nusrat - Meu primeiro objetivo é manter o estilo Qawwali, que está na minha família por mais de 600 anos. Há várias gerações minha família é conhecida pelo estilo tradicional de música.
Já fiz algumas experiências para mostrar às novas gerações o que é a música Qawwali. Já usei instrumentos modernos em algumas apresentações e gravações. Gosto de música clássica ocidental e jazz.
Folha - Como seu pai passou para o sr. esta tradição familiar?
Nusrat - Meu pai queria que eu fosse médico ou engenheiro. Achava que o trabalho de músico era muito duro e precisava de muita dedicação. Ele ensinava outras crianças e eu assistia às aulas escondido.
Um dia ele me descobriu e acabou aceitando que eu seguisse na música e começou a me ensinar. Primeiro a tabla, porque na opinião dele o ritmo é a coisa mais importante.
Folha - E quem vai sucedê-lo? O sr. tem filhos?
Nusrat - Tenho uma filha. Mas, no islamismo e na tradição Qawwali, a mulher não pode ser uma cantora. Tenho um sobrinho, filho de meu irmão, que está aprendendo comigo.
Folha - No Brasil provavelmente as pessoas não vão entender o que o sr. está cantando. Do que falam suas canções?
Nusrat - Falam de paz, fraternidade, amor, devoção ao divino. Mas quando canto para platéias estrangeiras uso menos palavras e mais o canto puro, sem palavras, para que me entendam melhor.
Folha - Quanto tempo vai durar o show?
Nusrat - Depende do espírito da platéia. Não há músicas com duração menor do que 25 minutos no Qawwali. E elas podem durar até horas com a improvisação.
Folha - Como o sr. vê o fundamentalismo islâmico que atinge o seu país e também outros países muçulmanos?
Nusrat - (O intérprete diz que é melhor não tocar em assuntos como este, mas Nusrat prefere responder) Todos os ramos do islamismo amam a minha música, sejam xiitas, sunitas, sufistas. Ela transmite uma mensagem de amor, paz e fraternidade.

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