São Paulo, domingo, 3 de julho de 1994
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Nasa anuncia identificação de 1º buraco negro

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

No começo do mês passado, a Nasa anunciou a possível identificação do primeiro buraco negro no centro da galáxia M87. Se confirmada a interpretação, buracos negros passarão da pura teoria para a realidade astronômica.
Explicado em termos muito simples, buraco negro é região celeste com campo gravitacional tão intenso que atrai e engole tudo o que dele se aproxima, inclusive estrelas, aumentando cada vez mais de tamanho.
Nem a luz escapa a esse sorvedouro, do qual não pode ser reemitida. Por isso o buraco permanece invisível (daí o seu nome).
O buraco negro astronômico é tradução do inglês "black hole", expressão criada pelo físico norte-americano John Wheeler, da Universidade de Princeton, em 1967.
A existência de astros invisíveis, desprovidos de luz, remonta aos gregos da Era Cristã, como produto de mera especulação. No século 18 a idéia ressurgiu com o astrônomo inglês John Michell e o matemático francês Pierre Simon de Laplace, alicerçados na ciência newtoniana de seu tempo.
Essas teorias não despertaram entretanto grande interesse até o advento da teoria da relatividade geral de Albert Einstein em 1915 e os progressos da astrofísica.
Muito cresceu nos tempos recentes o interesse pelos buracos negros que, a partir dos trabalhos de Schwarzschild em 1916, passaram a ser objeto de muitas especulações teóricas sobre sua natureza, estrutura, formação e destino.
Os especialistas conceberam vários tipos dessas estruturas, e os astrônomos reconheceram-nos como possível fase terminal da evolução das estrelas, representando o término do processo que sofrem as estrelas em colapso (anãs brancas, estrelas de nêutrons e buracos negros).
Em 1985 a astronave Discovery lançou o satélite Spartan 1 para registrar a emissão de raios X no centro de nossa galáxia, com o objetivo, entre outros, de ali tentar localizar um buraco negro previsto pela teoria.
Esse suposto buraco teria 700 milhões de quilômetros de diâmetro e massa igual à de 100 milhões de estrelas.
Agora a Nasa anuncia que o telescópio espacial Hubble viu alguma coisa estranha escondida a 50 milhões de anos-luz no centro da galáxia M87 (ano-luz é a distância percorrida pela luz no vácuo em um ano).
Aquela "alguma coisa" tem massa de mais de 2 bilhões de estrelas do tamanho do Sol apertadas em espaço que regula com o ocupado pelo Sistema Solar. Para muitos cientistas, a única explicação viável para o achado é a existência ali de um buraco negro.
Os buracos negros são por definição invisíveis, de maneira que os astrônomos, examinando os dados do Hubble, não viram nenhum buraco negro, mas em vez disso detectaram uma nuvem de gás em forma de disco girando a 1,9 milhão de quilômetros por hora.
As estrelas que se aproximam muito do buraco negro são literalmente sugadas pela gravidade e deslizam, espiralando, para dentro do sorvedouro cósmico. Nesse processo, o gás comprimido é aquecido –no caso presente a uma temperatura de 10 mil graus Celsius.
O grande argumento que convenceu os astrônomos foi a velocidade do gás que, aliada aos 60 anos-luz de tamanho (diâmetro), autoriza, pelas leis da mecânica celeste, a conclusão de que a nuvem gasosa deve estar circulando em torno de algo de massa e densidade sem precedentes.
Por enquanto, M87 é o primeiro buraco negro supermaciço já descoberto, segundo afirma Michael D. Lemonick em "Time" de 6 de junho. Mas é bom esperar análise mais profunda para tirar conclusão tão categórica. Um "possivelmente" caberia bem na frase.

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