São Paulo, quarta-feira, 6 de julho de 1994
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MP investiga mortes em manicômio

LUIS HENRIQUE AMARAL
DA REPORTAGEM LOCAL

O Corpo de Bombeiros de Mauá (29 km a sudeste de São Paulo) começa hoje a escavar o terreno do manicômio São Marco. Buscam corpos de internos que teriam sido mortos e enterrados no local, segundo denunciou um ex-paciente.
A escavação foi solicitada pelo Ministério Público e autorizada pelo proprietário do manicômio.
"Podemos estar à frente de um caso semelhante ao da Escola Base, onde foram feitas denúncias graves e infundadas. Ou estamos puxando a ponta de um iceberg", diz o promotor Eder Segura, de Mauá, que solicitou as escavações.
O assassinato e desaparecimento de pacientes é a denúncia mais grave entre as diversas que estão sendo feitas contra o Centro Social São Marco (leia texto abaixo).
Elas são investigadas pelo Ministério Público, pela polícia e por duas Comissões Especiais de Inquérito realizadas nas Câmaras Municipais de Santos e de Mauá.
No início do mês passado, o ex-interno M.A., 24, (que pede para não ser identificado por medo de represálias) denunciou ao Ministério Público que auxiliou no enterro de quatro internos que morreram em brigas dentro do manicômio.
M.A. foi um "crachá" na instituição por dois meses. Segundo o hospital, esse era o termo dado para pacientes que apresentavam progressos e que recebiam tarefas específicas como forma de "terapia". Eles usavam crachás.
Segundo a coordenadora do movimento S.O.S Saúde Mental (que se opõe à existência de manicômios), a psicóloga Isabel Cristina de Godoy Lopes, os "crachás" são uma "aberração".
"As enfermeiras que depuseram afirmaram que os crachás cuidavam da disciplina e, até, da enfermagem dos pacientes. Colocar um doente mental para fazer isso é um crime", diz Cristina.
Para ela, os "crachás" colocavam "sua agressividade a serviço da instituição".
Segundo o depoimento de duas ex-enfermeiras ao Ministério Público, os "crachás" espancavam os outros internos, provocando fugas e ferimentos constantes.
O portuário João Gomes seria uma das vítimas dos "crachás". Ele se internou para tratamento de alcoolismo em dezembro de 92 e está desaparecido.
As duas enfermeiras, que não querem se identificar, afirmaram ao promotor que "ouviram falar" sobre as mortes de internos, mas nunca presenciaram uma delas.
Ainda segundo elas, alguns dos "crachás" eram condenados pela Justiça. Estariam cumprindo pena e foram levados ao manicômio por apresentarem distúrbios mentais.
O São Marco –que chegou a atender 700 pacientes no ano passado- solicitou descredenciamento da rede pública de saúde em janeiro, quando as denúncias começaram a aparecer. Hoje, atende apenas pacientes particulares.

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