São Paulo, terça-feira, 12 de julho de 1994
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A vitória dos aumentos

JANIO DE FREITAS

É gafe, na certa. Igual à do comentarista esportivo que, em vez de entoar o aconselhável oba-oba, lembrasse que no gol de Bebeto o juiz não marcou o impedimento de Romário e, quando empatado o jogo, deu oportunidade à vitória do Brasil não marcando a falta (já confessada pelo autor) de Branco, mas a falta imediatamente posterior em Branco.
É assim mesmo nos meios de comunicação. De vez em quando um fato relevante, de divulgação indispensável para que o jornalismo não se transforme em instrumento de manipulação da opinião pública, toma o que a linguagem dos registros policiais chama de "destino ignorado e não sabido". Foi o que aconteceu agora com o índice de inflação da primeira semana do real, apurado pela Fipe.
As previsões exaustivamente difundidas eram de que a entrada do real sustaria os aumentos de preços e, portanto, a inflação. Se confirmadas as previsões, aí estaria uma notícia –importante para aumentar a confiança no plano. Se invalidadas, aí estaria uma notícia –importante como demonstração da persistência de certos setores em sobrepor a sua voracidade até ao interesse do país, enquanto o governo titubeia.
Na primeira semana do real, encerrada sexta-feira, a inflação apurada pela Fipe foi de 5,2%. Dois terços acima dos 3% que a equipe econômica previu para todo o mês de julho. Daí e da queda de certos preços na casa do zero vírgula um bocadinho, emergem duas evidências.
Estas quedas, que se noticiam como "desabamento" dos preços e da inflação, não passam do truque sempre usado de elevar bastante os preços e, se houver reação consistente, reduzi-los em proporção muito menor do que o aumento ou pôr os respectivos produtos em promoções, que baixam os índices mas já trazem implícito o aviso de que o preço maior retornará. A cesta básica atesta bem esse truque: caiu perto de 1% desde o real, mas só nas primeiras 48 horas do real tinha subido pelo menos 5%.
O governo, por sua vez, reforça a evidência de que, quanto mais ferozes as suas ameaças, menos providências toma e mais se satisfaz com resultados apenas enganadores da opinião pública. O palavrório irado contra os oligopólios, com uma nova lei estabelecendo punições duras e mesmo cadeia, está resultando em ilusionismo que é, no fundo, uma vitória absoluta dos oligopólios como fabricantes dos aumentos fantásticos e da inflação absurda que recepcionou o real.
Pois não é mais do que ilusionismo o acordo que o ministro Rubens Ricupero está propondo aos oligopólios, e já fechou com o dos pneus, em troca de que não fiquem aumentando preços: segundo o interesse de cada setor oligopolizado, baixam-se os impostos de importação de suas matérias-primas ou elevam-se os impostos para a importação de produtos que aqui chegariam com preços mais baixos do que os nacionais. Até dez dias atrás, o ministro dizia que os preços elevados iam ser combatidos com menores impostos de importação para produtos concorrentes. Está consagrando os aumentos que chamou de frutos só da ganância e punindo a quase totalidade da população.

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