São Paulo, quarta-feira, 13 de julho de 1994
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'Sofrimento acabou', diz Nasser

DA REPORTAGEM LOCAL

O banqueiro Ezequiel Edmond Nasser, 49, disse ontem que sofreu nos 75 dias em que esteve no cativeiro. "O sofrimento acabou."
Nasser foi sequestrado em 28 de abril passado, no Morumbi (zona sul de São Paulo), e libertado anteontem após o pagamento do resgate.
Acompanhado de seu irmão Jacques Nasser e de seu pai, Rahmo Nasser, ele leu ontem uma declaração à imprensa.
Em seguida, o advogado Márcio Thomaz Bastos relatou os detalhes do sequestro.
Segundo Bastos, o banqueiro foi obrigado pelos sequestradores a tomar Valium e Lexotan (dois sedativos) durante o tempo de cativeiro.
Os sequestradores também teriam comprado remédios para a úlcera gástrica do banqueiro.
Nasser foi obrigado a ficar em uma barraca dentro de um quarto de seis metros quadrados. Ele dormia em um pequeno colchonete.
O banqueiro ouvia músicas de Daniela Mercury e Jorge Benjor em três gravadores ligados diariamente.
Nasser tinha que limpar o cativeiro todos os dias e sua barraca era revistada. Uma luz forte ficava acesa o dia todo.
Ele recebia três refeições diárias (frutas, ovos e salada) e todas as comunicações com os sequestradores eram feitas por bilhetes.
Os sequestradores datilografavam perguntas e o banqueiro as respondia à mão. A maioria das perguntas era sobre o funcionamento de seu banco, o Excel, e sobre a família de Nasser.
O banqueiro estima que sete ou oito pessoas tenham participado do sequestro.
Nasser disse que não teria condições de reconhecê-los, pois eles sempre usavam capuzes ao entrar no quarto.
Ele disse também que não teria condições de identificar qualquer tipo de som característico das proximidades do cativeiro.
No último mês, os sequestradores compraram jornais diários para o banqueiro.
"Ele está informado sobre o real e ouviu a transmissão dos três primeiros jogos da seleção brasileira na Copa do Mundo", disse Bastos.
Nasser acompanhou os jogos por um rádio que os sequestradores sintonizaram em uma estação de ondas curtas.
A negociação do resgate foi feita por cartas, telefonemas e anúncios de jornais.
Ao todo, os sequestradores teriam feito dez contatos com a família, que não revelou o valor e como o resgate foi pago.
A Folha apurou que teria sido paga uma quantia entre US$ 1,5 milhão e US$ 6 milhões.
A família recebeu dos sequestradores apenas uma prova de que o banqueiro estava vivo. Era uma fotografia de Nasser segurando um jornal do dia.
Antes de ser libertado, o banqueiro foi sedado, encapuzado e levado de carro pelos sequestradores até São Bernardo do Campo (SP).
Ao descer do carro, o banqueiro recebeu as primeiras notas de real. Os sequestradores lhe deram R$ 25,00 e duas fichas telefônicas.
Mandaram que contasse até 50, tirasse o capuz e usasse o dinheiro e as fichas para voltar para casa. Nasser andou cerca de 40 quadras e telefonou para casa em uma padaria. Em seguida, pegou um táxi e foi ao Morumbi.
Na declaração à imprensa, Nasser disse que estava "muito cansado".
O banqueiro, que havia sido proibido de falar qualquer coisa pelos sequestradores, ficou conversando com a família e com um rabino na madrugada de ontem.
A polícia não tinha até ontem pistas sobre os sequestradores. A Delegacia Anti-Sequestro deverá ouvir o depoimento de Nasser nas próximas semanas.
"Ele (Nasser) pretende colaborar com a polícia e fornecer todos os detalhes possíveis sobre o cativeiro", disse Bastos.
O sequestro de Nasser foi o segundo mais longo do Estado de São Paulo. Ele durou 75 dias e só é superado pelo do fazendeiro Décio Ribeiro, que ficou 76 dias no cativeiro.

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