São Paulo, segunda-feira, 18 de julho de 1994
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Um divisor de águas para o PT

LUÍS NASSIF

O senador José Paulo Bisol não é vítima de conspiração ou massacre. A fogueira inquisitorial que o queima é a mesma da qual ele se valeu para assar os infiéis.
A imprensa nada mais fez do que cumprir o mesmíssimo roteiro que seguia quando dava guarida às denúncias do PT e do próprio Bisol –e era erroneamente acusada de petista pelos atingidos.
Até algum tempo atrás, para a a classe política (entendidos todos os poderes que se alimentam do Estado), desonestos eram aqueles que se valiam do cargo para incursões individuais sobre o erário. Honestos eram os que se aproveitavam das vantagens que, no poder, eles próprios se autoconferiam.
O jogo mudou. Desonesto é todo aquele que se vale de suas funções públicas para auferir benefícios para si ou para sua categoria, em detrimento do conjunto de contribuintes e de miseráveis.
O PT teve papel relevante nessa redefinição da ética política –como tiveram os republicanos de 1889 e os democratas de 1985, antes de se tornarem poder.
Dia após dia, todos eles ganharam espaço político trazendo à tona denúncias de empreguismo, de aposentadorias indevidas, de privilégios imorais do velho regime. Não denunciavam apenas ladrões contumazes, mas toda a lógica política que colocava o Estado a serviço dos vencedores.
Na medida em que se tornam poder, o fogo sagrado cede espaço ao descanso do guerreiro –que ninguém é de ferro.
Jogo dos vitoriosos
Em sua entrevista ao repórter Carlos Eduardo Alves, da Folha, Bisol sustenta estar sendo vítima de uma armação dos donos do Estado brasileiro –como se os benefícios que auferiu, como juiz, não fossem prerrogativa de donos de Estado.
Não há nada mais revelador desse espírito conquistador, do que a resposta dada por ele à pergunta: "O sr. acha que agiu corretamente ao aceitar empréstimos a que a maioria da população não teria acesso?". A resposta: "O PT, o PSB e qualquer associação ou agrupamento ou coletividade brasileira, funcionários do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, do Ministério Público, funcionários da Justiça... todos eles tiveram e têm esses empréstimos".
É preciso mais?
É sintomático que na questão do Orçamento, a integridade das idéias petistas, evitando emendas individuais, tenha sido preservada por aqueles parlamentares acusados de contemporizadores pelos radicais –como José Genoino e Paulo Delgado.
Quem recorreu às emendas individuais foram os jacobinos. O mais radical de todos apresentou emendas, não para programas de combate à miséria, mas para a Petrobrás, para garantir salários a corporações estatais. Só são radicais em sua estratégia de tomada do poder.
Ou Lula demonstra agora capacidade de administrar conflitos e de definir claramente o compromisso do partido com a cidadania e a nova ética, ou não se espere de seu governo –se a fogueira Bisol não liquidar antes com sua candidatura– mais do que a administração de favores àqueles que tornaram o Estado refém de seus privilégios.
O povo e seus militantes sinceramente comprometidos com a cidadania que aguardem a formação do próximo partido radical.
A Cofins
Na sexta-feira o Secretário da Receita, Ozires Lopes da Silva, entrou em contato com a coluna para informar que autorizou o parcelamento das dívidas da Cofins (beneficiando os que entraram com ações contra o Estado e não depositaram em juízo) porque o índice de inadimplência do imposto era de 85%.
Diz que o parcelamento não fez parte de supostos acordos políticos de Fernando Henrique Cardoso –conforme a coluna afirmou. E aproveitou para ainda na sexta mandar bala nos novos inadimplentes.

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