São Paulo, domingo, 24 de julho de 1994
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Flutuações do dólar, do iene e do marco

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há dois conjuntos de fatores que afetam as taxas de câmbio de uma moeda.
Primeiro, estão os denominados "fundamentos", isto é, fatores do lado real da economia, como a taxa de crescimento do PIB, o perfil tecnológico, a situação do balanço de pagamentos e, deste, particularmente de uma conta crítica chamada conta corrente (que é a soma das contas de comércio, de serviços e doações unilaterais).
Segundo, vêm os fatores monetários: as taxas de juros de curto e de longo prazos, avaliação da política monetária recente, sua perspectiva para os próximos meses e a projeção de inflação.
O jogo dessas forças resulta em uma taxa de câmbio verificada no mercado. Mudanças nos fatores monetários costumam afetar a taxa de câmbio com rapidez, dado que os mercados monetários funcionam com muita agilidade.
Mudanças nos fatores reais (ou uma reavaliação das perspectivas futuras da economia) tendem a redefinir o intervalo no qual pode oscilar o câmbio.
Geralmente, os fatores reais atuam com mais lentidão, mas quando indicam que a taxa cambial precisa se readequar à competitividade da economia, sua força sobrepassa o poder de reação das variáveis monetárias.
A queda do dólar nos últimos meses representa uma tentativa de correção de uma conta que está bastante desequilibrada nos últimos anos. Trata-se do persistente déficit em conta corrente dos Estados Unidos.
Atualmente, este déficit anda pela casa dos US$ 100 bilhões por ano e isso resulta principalmente de um grande déficit comercial para com o Japão.
A avaliação dos mercados é a de que um déficit dessa ordem não pode continuar indefinidamente, pois nesse processo a economia americana está acumulando uma elevada dívida externa (denominada em seus próprios dólares). Assim, o mercado tem pressionado para baixo a razão de troca entre o dólar e o iene japonês.
O gráfico que acompanha o texto mostra a tendência de queda do dólar vis-à-vis o iene entre 1993 e 1994. Na realidade, essa tendência vem sendo observada desde 1992.
Nesta última semana houve uma certa calmaria nos mercados, pois se espera que o Banco Central americano, em breve, induza a uma leve elevação das taxas de juros de curto prazo.
A taxa dos "federal funds" nos EUA deve subir de 4,25% para 4,5% (ou mesmo um pouco mais), até agosto. Prevê-se que, pelo final do ano, essa taxa deva se elevar para algo próximo de 5% ao ano.
A questão que muitos levantam é se isso será suficiente para estabilizar o dólar. Uma análise dos fundamentos mostra que ainda há pressão para que o dólar caia um pouco mais em relação ao iene (talvez para algo como 90 ienes).
A queda do dólar representa um fator de estímulo para a economia americana (pois as exportações americanas ficam mais baratas e as suas importações, mais caras), mas reciprocamente introduz um fator de contração para o Japão, cuja economia precisa ser estimulada para diminuir o superávit comercial de mais de US$ 130 bilhões ao ano.
Para complicar a situação, o fato é que o déficit comercial americano reflete, em grande parte, um desequilíbrio interno de sua economia. A taxa de poupança doméstica dos Estados Unidos é inferior ao montante que é investido. Para fechar o hiato de recursos, é preciso importar mais do que se exporta.
Esse tipo de desequilíbrio necessita tanto de correções internas na economia americana, quanto da coordenação de políticas com o Japão e a Europa e alguma noção mais clara sobre qual deve ser a faixa estável do valor de troca do dólar, do marco e do iene. Mas as dificuldades em vencer esses desafios são enormes e não estão próximas de superação.
Assim, restam as flutuações cambiais para indicar que se está longe de uma situação estabilizada. Senhores operadores com moedas estrangeiras: aguardem, nos próximos meses, mais trepidação!

ÁLVADO ANTÔNIO ZINI JR., 41, é professor livre-docente da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP, PhD em Economia pela Universidade de Cornell (EUA) e autor dos livros "Taxa de Câmbio e Política Cambial no Brasil" (Editora da USP) e "The Market and the State in Economic Development" (Editora North Holland). Está passando o ano como professor-visitante na Universidade de Harvard (EUA).

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