São Paulo, sexta-feira, 29 de julho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Morte de Gardel firmou mito do tango

LUIS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

José Lino Grünewald merece o predicado de "tangólogo" com a publicação de "Carlos Gardel, Lunfardo e Tango". Embora não seja e nem pretenda ser um ensaio profundo sobre o tema, acrescenta uma ponte entre o tango e a música brasileira.
É igualmente útil como obra de referência. Fornece discografia de Gardel, vocabulário lunfardo e uma lista de biografias dos principais astros do gênero. Uma antologia bilíngue de lunfardo e letras de tango no final do volume introduz o leitor na série poética do tango.
Os "tangólogos" formam uma confraria muito forte. Nem a morte de seus membros os separa da irmandade.
Pelo contrário. Gardel responde pela presidência da entidade desde que morreu de chapéu cinza numa colisão de aviões na pista do aeroporto de Medellín (Colômbia) em 24 de junho de 1935. O corpo (a dentadura branca chamava atenção) só chegou a Buenos Aires em 5 de fevereiro de 1936. O enterro, no dia seguinte, marcou a fundação da "tangologia".
Grünewald segue de perto os preceitos da congregação. Seu objeto só poderia ser Gardel. Objetivo modesto: mostrar que o cantor é o maior mito da canção.
Narra a evolução do artista (nascido Charles Gardes), de tenor a barítono, dos primeiros contatos com os "payadores" no início do século ao sucesso mundial e o contrato com a Paramount.
Conta como Gardel formou em 1911 dupla com José Razzano; o primeiro contrato com gravadora, em 1912; a turnê incógnita por São Paulo e Rio em 1915.
O livro explica por que Gardel tirou o tango dos bordéis para levá-lo aos palcos de teatro. O fato aconteceu em 14 de outubro de 1917, no teatro Empire. Gardel cantou "Mi Noche Triste"(Samuel Castriota-Pascual Contursi), marco inaugural do tango-canção.
Enquanto sonorizava a patota do "bas-fond", tango era música instrumental dançante e alegre. Com Gardel, ganhou figurino romântico de canção com versos em lunfardo. Apareceram as orquestras típicas. Os arranjos se tornaram mais elaborados. O cafetão ganhou ares de maestro.
A narração de Grünewald se interrompe com a morte de Gardel e do período clássico do gênero. Não se detém no tango contemporâneo, novamente instrumental, inagurado por Astor Piazzolla (1921-1992). O último capítulo do livro é dedicado à análise das qualidades vocais de Gardel, artista preocupado com a interpretação das palavras.
O autor trai fascinação pela legenda em torno do ídolo. A certa altura, enumera seus apelidos. Os melhores são "El Aficionado", "El Mudo" e "El Bronce que Sonrie", o bronze que sorri.
"O que será um mito?", pergunta Grünewald. "A concretização da vontade coletiva. Mas, no caso de Gardel, ainda não se pára por aí. Essa mítica foi ganhando foros icônicos e chegou ao misticismo". Falou o "tangólogo".
(LAG)

Texto Anterior: Livro narra influência do tango no Brasil
Próximo Texto: TERMOS DE LUNFARDO ASSIMILADOS NO BRASIL
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.