São Paulo, domingo, 31 de julho de 1994
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Paraíso artificial

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – A equipe econômica comandada primeiro por Fernando Henrique Cardoso, hoje candidato, e depois por Rubens Ricupero cansou-se de dizer que um dos grandes méritos do Plano Real (ou FHC ou como se queira chamá-lo) residia no fato de que o governo tratara primeiro de arrumar a própria casa para só depois se aventurar na tentativa de domar a inflação.
Agora, anuncia-se uma inflação em real próxima de zero, quando "descontaminada" da influência dos meses anteriores. Logo, pode-se concluir que o pesadelo do déficit acabou, certo?
Errado. O jornal "Gazeta Mercantil", na sexta-feira última, mostra que o déficit de caixa no primeiro semestre do ano bateu em R$ 3,298 bilhões.
O importante, aí, não é nem o déficit em si. O problema é que ele aparece apesar do artifício de não haver Orçamento aprovado para 1994, embora já tenham transcorrido sete dos 12 meses do ano.
Consequência do artificialismo orçamentário, apenas na área de saúde, segundo texto do ministro Henrique Santillo: "Os minguados duodécimos, repassados sem correção até o mês anterior, apenas geraram uma angustiante desatualização mensal superior a 40%".
Em outras palavras: à falta de Orçamento, o governo repassa aos ministérios a cada mês apenas 1/12 do que fora gasto no mesmo mês do ano anterior, causando a desatualização apontada por Santillo.
Pior: o gasto per capita com saúde, em um país profundamente doente, caiu do pico de US$ 85,6 em 89 para menos da metade em 93 (US$ 39,1), sempre segundo dados citados por Santillo, a partir de levantamento do Ipea, organismo igualmente governamental.
Salta aos olhos que essa situação é insustentável. Na verdade, a queda da inflação se deve, além da quebra da inércia inflacionária na troca da moeda, ao congelamento de tarifas públicas e do câmbio, para não falar da contenção salarial generalizada.
O que acontecerá logo no início do próximo governo, quando tais congelamentos tiverem se esgotado e a realidade orçamentária tiver que ser restabelecida?

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