São Paulo, domingo, 31 de julho de 1994
Texto Anterior | Índice

Perigo à vista!

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Foi motivo de aplauso a decisão dos governadores ao concordarem com a manutenção do ICMS para automóveis no nível de 12%. O setor mais do que merece essa concessão pois, direta e indiretamente, ele responde por uma soma fantástica de empregos, rendas, divisas e impostos.
Por outro lado, foi motivo de espanto ver os mesmos governadores (e alguns prefeitos) aumentarem os impostos através de sua correção diária baseada nos antigos indexadores de tributos. Não tem cabimento aliviar de um lado para elevar de outro –numa hora em que toda a nação se esforça, torce e reza para se acabar com a inflação.
Que coincidência infeliz! Abater imposto aqui para aumentar ali não é justo. Na verdade, a reindexação de impostos, a esta altura, significa a implantação de uma verdadeira bomba-relógio debaixo do Plano Real.
Pior: tudo feito quando os primeiros resultados animadores começavam a surgir: os juros baixando; o governo anunciando medidas de estímulo à exportação para ajudar a manter o emprego; e os preços da cesta básica cedendo à implacável destruição ocasionada pela inflação.
Aumentar impostos é, definitivamente, uma má idéia, tomada num momento inoportuno. O pretexto foi o fato de o governo da União ter reajustado a Ufir.
Ocorre, porém, que aquela unidade é aplicada única e exclusivamente aos maus pagadores que se acostumaram a atrasar o recolhimento de tributos porque aplicavam os recursos na ciranda financeira, que sempre rendeu muito mais do que o bom comportamento diante do fisco. Portanto, o uso da Ufir para esse fim não pode justificar a reindexação dos tributos estaduais e municipais.
Nas primeiras semanas de julho, observou-se o cumprimento rigoroso do rito da austeridade por parte do povo, sintetizado na restrição de compras e na crescente valorização da nova moeda sem falar, é claro, no sacrifício natural dos que nada têm e que tiveram de arcar com a mais espantosa corrida de preços do último mês de junho.
Os governantes decidiram aumentar os impostos no momento em que 75% dos brasileiros demonstram confiar e acreditar no Plano Real, achando que, desta vez, a inflação vai cair e vai ficar baixa por uns bons tempos –oxalá para sempre.
Falaram tanto do mau exemplo da delegação brasileira na alfândega do Rio. Está aí: outro mau exemplo. Os governantes deveriam ser os primeiros a demonstrar a sua boa conduta e sua clara adesão ao sacrifício nacional. Mas que nada... Eles revelaram ser adeptos do salve-se quem puder numa operação que só pode ser atribuída à má informação ou a muita maldade política dos que desejam fazer o programa de estabilização fracassar.
Isso parece-nos errado. E, tenho certeza que, pensando melhor, aqueles governantes corrigirão a infeliz decisão, pois a história e os eleitores não os perdoarão se insistirem em desempenhar o papel de detonadores do promissor Plano Real.

Texto Anterior: MELHORES VOTOS; CANDIDATOS A QUÊ?; EXCESSO DE PESO; ASSIS CHATEAUBRIAND; LUGAR-MAIS-QUE-COMUM
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.