São Paulo, sexta-feira, 5 de agosto de 1994
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Tapando o sol com a peneira

ARSELINO TATTO

Em artigo publicado na Folha na edição de 21 de julho, Edis Milaré, secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, acabou carregando em demasia nas cores e perdeu uma boa oportunidade de traçar um perfil correto da problemática dos mananciais.
Na verdade, a solução para o problema passa necessariamente por doses reforçadas de sensatez e ponderação. Estes foram os parâmetros que nortearam os legisladores municipais a derrubar o veto que impedia a regularização de edificações em áreas de mananciais.
Com efeito, inúmeros estudiosos consideram que tal anistia não produzirá efeitos significativos na caótica situação da zona sul, região que concentra a maioria das áreas de proteção aos mananciais.
Ao contrário, as áreas de mananciais e a sociedade em geral seriam as grandes beneficiadas, pois as mais de 950 mil pessoas que lá vivem teriam acesso ao saneamento básico, interrompendo-se o ciclo poluidor.
Na realidade, a tão falada lei nº 898/75, que protege as regiões de mananciais, enquadra-se no rol de soluções "ideais", arquitetadas por hiperdotados para a grande maioria hipossuficiente.
Citando Ramon Martin Mateu, em sua obra "El Urbanismo y las Categorias Jurídicas Tradicionales", o jurista às vezes deve esquecer o próprio hábito mental de conservação do direito vigente e recordar que, em outras épocas, fora o agente das mutações sociais e que os homens de leis foram os que animaram uma nova ordem sincronizada com as necessidades.
Nesse sentido, vale a pena relembrar o plano elaborado por técnicos, ambientalistas e movimentos de moradia, no qual a região sul da capital seria dividida em três setores: bairros já adensados e com mais de 20 anos de existência, bairros adensados circundados por matas e zona rural.
Ao primeiro, levar-se-ia infra-estrutura, como rede de água e esgotos, creches, postos de saúde etc. O segundo, ao mesmo tempo que seria beneficiado por infra-estrutura, sofreria fiscalização visando impedir o aumento do adensamento populacional. E o terceiro, o maior de todos, seria alvo de uma rígida fiscalização, impedindo-se qualquer ocupação.
Assim, a derrubada pela Câmara Municipal do veto ao dispositivo legal que anistia as construções em áreas de proteção aos mananciais beneficia a sociedade como um todo e não só uma "minoria de sem-terra" como querem alguns.
Dá-se início a um grande esforço comum buscando a imediata alteração da lei para assemelhá-la à realidade. Toda a sociedade deve ver onde está a oclusão, para safenar com um novo instrumento legal a problemática dos mananciais.

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