São Paulo, quinta-feira, 11 de agosto de 1994
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Leia a íntegra do discurso do ministro da Fazenda

Esta é a íntegra do discurso do ministro da Fazenda, Rubens Ricupero, em cadeia de rádio e TV:
Boa tarde. Demorei um pouco para voltar a conversar sobre a economia para deixar mais tempo para você sentir o que é viver sem inflação. Você já pode perceber que o salário mantém o seu poder de compra: os preços, em sua maioria, ficaram estáveis, muitos deles caíram e continuam a cair.
O Plano Real está dando certo graças ao apoio que vem recebendo de cada um de vocês. As pesquisas indicam que mais de 70% do povo brasileiro apoia o plano e aprovam o trabalho do presidente Itamar Franco. Isso mostra que estamos no caminho certo e que o fim da inflação era um desejo da imensa maioria dos brasileiros, que não suportavam mais conviver com aumentos diários de preços, com a especulação e com a carestia.
O real permite saber os preços de cor, comparar, lembrar quanto se pagou na semana passada. A estabilidade facilita a vida. Acabou aquela aflição com o dinheiro que se desvalorizava a cada dia.
Os efeitos concretos de ter uma moeda forte e de ser um consumidor consciente você está vendo no seu dia-a-dia. A cesta básica, por exemplo, já caiu 5,68% desde o dia 1º de julho até o dia de ontem. E deve cair ainda mais, se não tivermos problemas com o clima, como a geada. Estamos propondo aos governadores reduzir o imposto sobre os produtos da cesta básica e garantir que essa redução beneficie ainda mais o consumidor, tornando a cesta mais barata, especialmente para os mais pobres.
Estamos negociando com os produtores de frangos, ovos e carne de porco para garantir esses produtos, a preços razoáveis e estáveis, durante a entressafra da carne de boi. Se você substituir a carne de boi pela de frango, ovos e até carne de porco -que no Brasil, vou dizer, não está tão barata como devia-, vai sair ganhando, porque vai economizar e vai ajudar a baixar o preço da carne de boi.
O consumidor não pode baixar a guarda. Para manter os bons resultados que tivemos até agora, é preciso que a população continue nesta luta que é de todos nós. Ainda é cedo para acharmos que tudo está sob controle e que podemos nos despreocupar.
Mas você pode me perguntar: se a inflação já baixou, se os preços até cairam, se o salário manteve o seu poder de compra e até pode comprar mais, por que então não devo voltar a gastar o meu dinheiro do mesmo jeito que fazia antes? Por que continuar repetindo esse discurso pedindo cuidado e moderação nas compras?
A resposta é simples. Em primeiro lugar, porque os preços ainda podem cair muito mais. Há muita gordura nos preços. Isso você pode ver pelas promoções, às vezes com desconto de mais de 50%. Ora, quem dá desconto de 50%, e ainda tem lucro, é porque está trabalhando com ganhos muito elevados, com preços muito gordos. Se nós começarmos a comprar demais agora, esses preços podem parar de cair. Já se comprarmos com cuidado, adiando o que não é urgente e procurando o melhor preço, vamos sair ganhando ainda mais porque vamos comprar mais barato dentro de pouco tempo. E atenção: ainda há diferenças escandalosas, absurdas, entre os preços de um mesmo produto em lojas diferentes. Se o consumidor não tomar cuidado, vai sair perdendo muito.
Em segundo lugar, as lojas estão facilitando as vendas, dividindo o preço em três, quatro vezes, ou oferecendo crediário. E aí é que existem dois problemas. O primeiro é que, com o fim da inflação, é preciso prestar muita atenção na diferença entre o preço à vista e o preço total a ser pago a prazo. Some as parcelas. Quase sempre você vai se espantar com a diferença. E essa diferença não se justifica mais, porque a inflação é muito baixa e os juros estão caindo. O segundo problema, porém, é quando o preço à vista e o do crediário é o mesmo. Uma amiga minha, por exemplo, foi comprar aqui em Brasília uma armação de óculos e o vendedor pediu R$ 200 à vista ou cinco prestações de R$ 40. Ora, mesmo se a inflação fosse zero, existe um custo do dinheiro que é o juro. portanto, se o vendedor recusa fazer desconto à vista é porque nesse preço está embutido um lucro exagerado.
O consumidor brasileiro ainda está muito desprotegido, porque a inflação o acostumou a pensar que o preço é bom se ele puder comprar a mercadoria, não importando muito se o valor pago é justo. Com isso, acabamos comprando mais caro ou pagando juros altíssimos, que vêem embutidos nesses esquemas de pagamento facilitado.
Gostaria de pedir a todos, às donas-de-casa, aos aposentados, às pessoas que me escrevem para formar associações de consumidores. Não é difícil. Vamos distribuir nas agências do Banco do Brasil cartilhas com conselhos práticos para preparar listas de preços, com as leis Antitruste e do Consumidor. Peça ao seu jornal, ao seu clube ou igreja para publicar colunas e boletins para defender seus direitos, exigir produtos com qualidade, segurança, garantia, preços justos. Vamos organizar concursos para premiar as melhores iniciativas, vamos estimular com apoio financeiro, se preciso, a publicação de revistas comparando preços e qualidades de produtos, como em outros países. Em vez de ser o ministério dos poderosos, em vez de ser o governo dos poderosos, o governo do presidente Itamar, o nosso ministério, vai ser o ministério do consumidor, da dona-de-casa, do aposentado, daquele que nunca é ouvido quando se tomam decisões.
Por último, é bom lembrar que agora, com a inflação muito baixa, poupar passou a ser ainda melhor. Você pode planejar para o futuro, pensar em comprar uma geladeira ou uma máquina de lavar, um carro, ou mesmo a casa própria. E isso fica mais fácil se você tiver uma boa parte do dinheiro guardado para dar de entrada ou até comprar a vista. Assim, você negocia melhor o preço, tem mais escolha, pode avaliar melhor as oportunidades. Aquele hábito de gastar o dinheiro na primeira opção que aparecia é coisa do passado, de quando o dinheiro queimava na mão. Agora, é diferente.
A caderneta de poupança tem sido o melhor investimento, especialmente para o cidadão comum, o trabalhador, os que vivem de salário ou da aposentadoria. Não se deixe impressionar com o rendimento aparentemente mais baixo da poupança de agora em diante. Ele agora é um rendimento real e ainda por cima muito maior do que na maioria dos países que têm inflação baixa. A inflação roubava de nós o futuro e nos fazia olhar para o imediato, o curto prazo. Nos outros países, o rendimento da poupança é fornecido para o ano, não para o mês. Nos Estados Unidos, por exemplo, ela rende 4% ao ano, ou pouco mais. Aqui está rendendo mais de 30% ao ano.
Pense em tudo isso. você tem feito muito pelo sucesso deste plano. Ele só está dando certo por causa de você, por causa do seu apoio.

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