São Paulo, sábado, 20 de agosto de 1994![]() |
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Conto inédito revela erotismo de Mário
JOSÉ GERALDO COUTO
Publicado em esmerada edição crítica pelo Instituto Moreira Salles, em parceria com o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, o precioso texto será lançado na Bienal do Livro, que abre hoje para o público. O conto começou a ser escrito por Mário em 1927 e passou por sucessivas alterações até pouco antes da morte do escritor. Em 1940, a revista portuguesa "Presença" publicou um excerto do texto, entendido então pelo autor como parte de um futuro romance. Em sua última forma, publicada no início do volume lançado agora, trata-se inequivocamente de um conto autônomo, "redondo" e acabado, embora o autor não tenha tomado a iniciativa de publicá-lo em vida –o que aliás ocorreu também com seus "Contos Novos", de edição póstuma. O conto narra a trajetória pouco verossímil de um batedor de carteiras inglês que vem parar em São Paulo, onde se encontra com duas pedintes adolescentes. O encontro entre esses três seres desamparados é narrado com um assombroso frescor, mesclando erotismo, lirismo e revelação mística –não por acaso, o autor subtitulou a obra "O Descobrimento da Alma", e indicou seu gênero como sendo "idílio". Na edição publicada agora, o texto do conto é seguido de um minucioso estudo de sua gênese e transformação ao longo dos anos, de autoria da pesquisadora Telê Ancona Lopes, diretora do Arquivo Mário de Andrade, no IEB, e uma das maiores especialistas na obra do escritor. Graças a esse estudo, é possível retraçar passo a passo a escritura de "Balança, Trombeta e Battleship" desde as primeiras anotações de Mário, durante sua viagem pelo Amazonas em 1927, relatada no volume "O Turista Aprendiz". O estudo mostra, entre outras coisas, que as mendigas Balança e Trombeta foram inspiradas em moças da sociedade –Mag (Margarida Guedes Nogueira) e Dolur (Dulce do Amaral Pinto), que participavam daquela viagem. A primeira era sobrinha de Olivia Guedes Penteado, mecenas do modernismo que também estava na excursão, e a segunda era filha da pintora Tarsila do Amaral. O personagem Battleship, por sua vez, seria um compósito de um passageiro do mesmo barco com o próprio Mário de Andrade. Numa das versões, as meninas seriam costureiras pequeno-burguesas (e não mendigas), em outra a história se passaria no Rio. Ao longo das várias reescrituras, também a relação erótica do rapaz com as meninas foi se modificando. Em vez de deflorá-las, como nos primeiros esboços, ele tem com elas na última versão uma relação mais ambígua e sublimada. Telê Ancona disse à Folha que o manuscrito do conto estava guardado num envelope, entre os papéis de Mário. Dentro do envelope havia uma infinidade de notinhas, esboços e correções. "Fomos investigando aquilo, 'sherlockando', para encontrar o fio da meada." "Como se tratava de um texto póstumo, nossa primeira preocupação foi consultar as pessoas que podiam avaliar a importância da obra e a conveniência de sua publicação", afirma Franceschi. Além de Telê Ancona, o instituto ouviu duas autoridades de peso: o crítico Antonio Candido e sua mulher, Gilda de Melo e Souza, sobrinha de Mário de Andrade. A idéia inicial era publicar o livro durante as comemorações do centenário do escritor, em 1993. "Mas acabamos percebendo que o mais importante era fazer a edição mais bem cuidada possível", diz Franceschi. Dito e feito. Livro: Balança, Trombeta e Battleship Autor: Mário de Andrade Edição crítica: Telê Ancona Lopes Projeto gráfico: Hélio de Almeida Distribuição: Companhia das Letras Estande na Bienal: 91 (2º pav.) Preço: R$ 15,00 LEIA MAIS sobre Bienal do Livro à pág. 5-3 e sobre Mário de Andrade à pág. 5-6 Próximo Texto: Bienal abre hoje para o público Índice |
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