São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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Hanseníase isola moradores de Sucesso

PAULO MOTA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SUCESSO

O espectro do fracasso ronda os moradores de Sucesso (304 km a oeste de Fortaleza-CE) desde que começou a ser divulgada a ocorrência de hanseníase na localidade, distrito do município de Tamboril.
Com quatro casos da doença registrados oficialmente este ano, Sucesso ganhou fama de "antro de leprosos" nas cidades vizinhas.
A situação vem causando constrangimentos para os moradores do distrito e prejuízos para a já frágil economia local.
A hanseníase é uma doença transmíssivel conhecida popularmente por lepra. Ela causa manchas na pele e lesões no sistema nervoso periférico dos portadores.
O inferno astral de Sucesso começou no início de julho, quando emissoras de rádio de Crateús (a 36 km de Sucesso) divulgaram notícias de que a localidade enfrentava uma epidemia de lepra.
"Foram divulgadas informações baseadas numa carta anônima que dizia que havia 60 leprosos em Sucesso", disse o vice-prefeito de Tamboril, Jeová Mota (PFL).
O diretor da rádio Vale do Rio Poti, Rodrigues Vale, confirmou a veiculação da informação, mas disse que não lembrava o número exato de casos divulgado.
Na outra rádio de Crateús, a Educadora, o locutor João de Deus negou a divulgação da informação.
A notícia propagou-se pela região rapidamente e ganhou versões marcadas pelo preconceito que milenarmente recai sobre os portadores de hanseníase.
O comerciante Vital Araújo, de Nova Russas (a 28 km de Sucesso), diz que ficou "apavorado".
"Correu um boato que o pessoal de Sucesso estava pegando uma doença que em três dias provocava a queda de tudo o que tinha pendurado no corpo", diz Araújo.
Amedrontados, os moradores das localidades vizinhas passaram a evitar contato com a população de Sucesso.
Envergonhados, moradores de Sucesso começaram a negar a sua origem nas visitas às comunidades vizinhas.
A professora Rita Mota conta que toda vez quando faz compras em Crateús ou Nova Russas sente "um mal-estar" ao se identificar como moradora de Sucesso.
"Quando eu dizia onde residia, as pessoas encerravam a conversa e olhavam com medo. Quando eu saía, eles cochichavam", afirmou.
O padre de Sucesso, Helênio Pereira, diz que só percebeu a dimensão do preconceito na festa de Nossa Senhora do Bom Sucesso, padroeira da cidade, em julho.
"As missas, que anualmente lotam com os fiéis de fora, foram esvaziadas", disse Pereira.
O temor da doença teve também repercussões econômicas. Comerciantes estimam que as vendas caíram 30% nos últimos dois meses.
"Aqui em Sucesso todo mundo se sente fracassado. Os amigos fogem por um lado e os fregueses pelo outro", disse o dono de padaria Cláudio César Teixeira, 23.
A reação contra o preconceito começou a ser esboçada na última segunda-feira, quando a cidade parou para discutir a situação.
Numa assembléia realizada em praça pública, os moradores de Sucesso resolveram desencadear uma campanha informativa para recuperar a imagem do distrito.

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