São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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'Cegonha Avião' é lição de teatro infantil

MÔNICA RODRIGUES COSTA
EDITORA DA "FOLHINHA'

O mais interessante em "Cegonha Avião... Mentira Não!", peça adaptada do teatro do francês Yves Vedrenne pelo diretor (e ator) Joaquim Goulart, é que nada no espetáculo está acabado. O enredo e todos os outros signos vão sendo construídos à vista do espectador.
Assim, os únicos dois atores (Anna Taglianetti e Ednaldo Eiras) começam por vestir-se em cena. Inicialmente, eles se apresentam como crianças que vão brincar de faz-de-conta, atividade de representação "por excelência". Como não são "atores de verdade", podem sempre trocar de roupa em cena e mudar de papéis com naturalidade. Ora são os pais da história, ora os filhos. Falam atrás dos bonecos, nos papéis dos avós, e ao lado deles, enquanto atuam como os filhos.
A trama tem caráter pedagógico. O objetivo é ensinar as crianças entre 2 e 10 anos como nascem os bebês. Os signos do sexo e da reprodução ficam espalhados pelos cenários e figurino, são montados diante da platéia e vão sendo apresentados aos poucos.
O primeiro deles, reconhecível de forma imediata, é a cegonha, veiculada de diferentes modos. Esse símbolo desgastado pelo uso é recuperado de forma inteligente na canção sobre o pássaro (a trilha sonora é de José Miguel Wisnik, que recriou partes da original).
Além da canção da cegonha, Wisnik constrói sons, obedecendo ao critério digamos do "teatro se fazendo". Também apresenta estilos variados de música (chorinho, flauta indiana), em jogo que enriquece o repertório infantil.
A cegonha é apresentada também como um boneco. Os atores, aproveitando o fato de estarem em um ateliê de pintura, montam o pássaro com recortes e colagens. As formas de todos os bonecos de papel (de Ciro Pirondi) é exemplar de como é possível brincar a partir de materiais simples.
Depois, a cegonha aparece mais elaborada (a história também), pois tem a função de narradora. É um grande boneco (mas ainda simples, com design de poucas linhas) que preenche o palco com voz (da atriz Rosi Campos) e apóia de forma contida os diálogos –a narração não cansa e dá espaço à representação.
A peça é lenta. Diz respeito ao modo como o tema vai sendo esclarecido. A coreografia (Vivien Buckup e Ednaldo Eiras) impõe esse ritmo, mas não deixa de fluir. Os atores aproveitam essa lentidão para desenhar os gestos, as expressões faciais, os tons de voz, no vazio deixado por um ou outro aspecto do enredo.
A limpeza e os recursos gráficos impressionam pela simplicidade. O figurino de Niura Bellavinha contrasta cores e adereços, exagera formas –o berço, a barriga da mãe, os pêlos do pai, signo da masculinidade– e reduz outras, desnecessárias. A construção, combinada com cenário, trilha e iluminação (Guilherme Bonfanti) opera a favor das cenas, sem exibicionismo. Devia servir de lição ao teatro para crianças.

Peça: Cegonha Avião... Mentira Não!
Direção: Joaquim Goulart
Elenco: Anna Taglianetti e Ednaldo Eiras
Trilha: José Miguel Wisnik
Onde: Tuca (r. Monte Alegre, 1.024, Perdizes, tel. 873-3422)
Quando: Sábados e domingos, às 16h
Quanto: R$ 4,00

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