São Paulo, segunda-feira, 29 de agosto de 1994
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Aumento do consumo faz o juro subir

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O juro no mercado futuro está subindo. Os analistas de bancos apostam em uma inflação média de 1,5% a 2% para setembro e de 3,5% a 4% para outubro.
Mas não é exatamente a previsão de uma inflação maior para outubro que está por trás da alta dos juros. É o consumo.
Não há consenso nem no diagnóstico nem na terapia. Mas, como mostra o mercado futuro, está ganhando a corrente que defende alguma elevação das taxas.
Alguns analistas, que preferiram que seus nomes não fossem publicados, acreditam, como o governo, que o aumento do consumo está localizado na baixa renda e via crediário.
SPC
Em ambos os casos, o aumento da demanda tende a se esgotar quando o valor do crediário bater na capacidade de compra.
Os número e a previsão são da Associação Comercial de São Paulo. A entidade toma como base as consultas ao SPC (Serviço de Proteção ao Crédito).
Neste mês, as vendas à vista –medidas pelas consultas ao serviço Telecheque–, deverão cair 5,46% sobre agosto de 1993 e 6,46% sobre agosto de 1992.
"Dá para dizer que o consumo está mesmo aumentando. A queda na venda à vista é menor do que o crescimento na venda a prazo", diz Marcel Solimeo, economista da Associação.
Segundo ele, o aumento do consumo "não é nada explosivo."
Outros analistas, porém, estão mais preocupados. Acreditam que o aumento do consumo é generalizado e pode comprometer o plano.
Um sinal: o comportamento dos preços do telefone (um ativo real, como terreno, carros, ações).
Segundo pesquisa semanal do Datafolha, os preços dos telefones registraram queda contínua durante o mês de julho, mas, agora, em agosto, já apresentam alta por duas semanas consecutivas (1,14% e 0,93%, respectivamente). A inflexão é explicada como reflexo da elevação da demanda.
Os analistas citam o aumento das vendas de carros (novos e usados), material de construção, de bens duráveis e até de caminhões.
Para eles, o cenário é de um aumento sustentado da demanda que, se não controlado, pode rendundar em forte pressão sobre os preços.
Este efeito de aumento da demanda poderia ser ainda ampliado pelo esquema de indexação dos salários –corrigidos nas datas-base pelo IPC-r.
O novo índice mantém uma trajetória mais alta que todos os demais. Por problemas ou diferenças metodológicas, ainda existe "inflação" para todo tipo de gosto.
Um exemplo. No mesmo período de coleta, os aluguéis apresentaram alta de aproximadamente 40% no IPC-r, de 8% na Fipe e de aproximadamente 20% no IGP.
Taxa eficaz
Esta é uma das razões para que o governo tenha dito que, a partir da nova moeda, a formação do juro não seria mais apenas uma consequência dos índices de inflação, mas dependeria de outros fatores –como onde está o dinheiro e para onde ele está indo.
Concordando no diagnóstico, estes analistas se dividem ao propor soluções antagônicas.
Uma parte defende a elevação dos juros. Para estes, o governo só não subiu as taxas para um patamar eficaz porque a política (eleições) está se sobrepondo às decisões técnicas. O cenário adquire as cores de um Cruzado 2 –um pacote de medidas antipopulares pós-eleição.
A outra parte diz que, simplesmente, não adianta elevar os juros. Na hipótese de se adotar taxas explosivamente altas, como 10% ao mês, o plano se rompe –pelo juro e não pelo consumo. O governo é o maior devedor da economia e não há equilíbrio orçamentário que resista a uma taxa desta.
Além disso, um juro deste tamanho provocaria mais desarranjos no plano. Atrairia, por exemplo, mais capital especulativo do exterior –empurrando as cotações do dólar mais para baixo.
Para estes, a solução é mesmo limitar o crédito (o número de prestações) e liberar as importações –ou seja, conter o impacto da demanda sobre os preços com mais oferta.
O que estas discussões colocam no tabuleiro são dois fatos: 1) acabou a idéia de que o plano resolveu todos os problemas e está de volta o nervosismo ao mercado; 2) a moda é dizer que chegou a hora de o governo administrar.

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