São Paulo, quinta-feira, 1 de setembro de 1994
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Mostra confronta gerações de videomakers

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A quinta edição da mostra Radical Vídeo, no MIS, confronta duas gerações de videomakers. De um lado, um dos pioneiros da videoarte, o francês Robert Cahen, consagrado nos anos 70, e de outro o americano Paul Garrin, responsável por uma espécie de tecno-rap das imagens eletrônicas.
Tanto um como o outro parecem desafiar uma certa impressão de que o vídeo é uma arte em extinção precoce.
Grandes artistas do vídeo, como o americano Bill Viola, tomaram o caminho das instalações como saída para o esgotamento dos experimentalismos com as imagens eletrônicas.
Cahen e Garrin, ao contrário, insistem, com resultados bastante diferentes um do outro, num trabalho mais purista, exclusivamente com as imagens, e provam que a possibilidade de uma arte do vídeo sobrevive sem o imperativo de qualquer outro recurso externo.
Cahen, que já apresentou no Brasil o seu "Hong Kong Song", está representado na mostra com "La Notte delle Bugie" (A Noite das Velas) e alguns de seus "cartões postais", vídeos anedóticos de um minuto, mostrando uma imagem fixa, como uma fotografia turística, que ganha movimento por um instante, com o auxílio de sons, criando o que o videomaker chama de "micro-acontecimento".
"La Notte delle Bugie" é mais representativo do modo como o artista procura uma nova forma de narrativa através das imagens eletrônicas. Gravando uma festa popular em Pisa, com fogos de artifício, velas nas ruas e nas janelas, e as silhuetas dos pedestres caminhando pela cidade, Cahen cria uma clima onírico, uma atmosfera quase infantil, o terreno fértil para uma história –ou um mistério.
Mas ao contrário de uma narrativa tradicional, não há desenvolvimento dessas imagens. Elas giram em torno de si mesmas, repetindo-se como um tema musical (Cahen iniciou sua carreira como músico e seu trabalho em vídeo tem uma forte preocupação com a utilização dos sons).
O vídeo para o artista passa a funcionar como a vontade de sublinhar o detalhe das coisas, criando não uma antinarrativa, mas um vestígio de narrativa, onde todas as sequências são possíveis.
Cahen cria uma forma de narrativa ao mesmo tempo mininalista (por querer teatralizar o detalhe) e maneirista (por transformar o detalhe no principal, fazer do ornamento o centro).
O videomaker parece ter a intenção de reformular os códigos da ficção à sua maneira. A sequência de imagens superpostas transforma o que tradicionalmente, num filme, seriam apenas as bordas da narrativa em centro de uma intriga possível, que não acontece.
"Free Society", de Paul Garrin, é o vídeo tecno-rap. E esboça uma crítica social típica de uma geração do rap. A crítica não tem mais um alvo preciso, mas avança ao ritmo da música contra o poder visto como uma entidade maligna que domina toda a sociedade e não está em lugar nenhum.
No vídeo de Garrin, às imagens de militares marchando e policiais espancando pessoas se superpõe a voz distorcida do tele-evangélico Pat Robertson dizendo que "numa sociedade livre, a polícia e os militares são os enviados de Deus".
Os outros vídeos da mostra, como "Jazzland" e "Curtain Trip", do inglês George Barber, lidam com a idéia da imagem eletrônica como uma superfície capaz de criar um outro tipo de percepção visual, das narrativas e do mundo. Um mundo fluido, onde as coisas podem ser transformadas e criadas infinitamente. A começar pela própria videoarte.

Mostra: Radical Vídeo 5 (vídeos de Robert Cahen, Paul Garrin, George Barber, Shelly Silver, Jeanne Finley e do grupo dinamarquês Performancegruppen Vaerst)
Onde: Museu da Imagem e do Som (av. Europa, 158, Jardins, zona sul, tel. 280-0896)
Quando: a partir de hoje, até domingo, às 20h
Preço: entrada franca

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