São Paulo, sábado, 3 de setembro de 1994
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Veja íntegra da conversa de Ricupero com Monforte

ASSESSOR DO MINISTRO INTERROMPE A CONVERSA PARA FAZER PERGUNTA SOBRE O PROBLEMA TÉCNICO QUE ESTÁ ACONTECENDO

Carlos Monforte - Os bancos estão aí preocupados com esse negócio da poupança?
Rubens Ricupero - Do compulsório? Mas tem que ser. Vai dar uma freada grande. Isso vai baixar, ainda que seja no cacete. Não estão dizendo que eu só ia fazer medidas duras depois da eleição? É isso. Estavam dizendo isso. Que era o Real 1 e o Real 2. Isso não é uma medida popular, não é? Eles (bancos) andaram fazendo umas manobras... Eles andaram com negócio de CDBs. Umas coisas assim. Eu não estou dizendo, mas você indaga lá no Banco Central que você vai descobrir que tem umas histórias assim.
Monforte - E o IPC-r, como é que está? Fica esse mesmo índice ou acaba com ele?
Ricupero - Agora em setembro ele cai, viu. Eu não vou dizer porque eu não quero anunciar, mas eu já sei a primeira quadrissemana do IPC-r já caiu muito.
Monforte - Então fala isso, então.
Ricupero - Não, é que nós não anunciamos antes, não dá para anunciar agora. Se não o pessoal do PT vai dizer que nós... Quem sabe a semana que vem. Mas vai cair.
Monforte - Mas por que o IPC-r deu essa loucura, essa derrapada?
Ricupero - Eles fizeram um tremendo erro metodológico. Eles botaram todo o aluguel de uma vez só. Inclusive o aluguel que tinha aumentado antes do período de junho. O Pastore fez uma entrevista mostrando isso lá em São Paulo, né? Mas é difícil, né? Porque se você mexesse vão dizer que estava manipulando. Há uma tese também, um grupo que diz que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que divulgou o IPC-r) é um covil do PT.
Monforte - O que que é o covil?
Ricupero - O IBGE... Não sei se é verdade, mas tem gente que está convencido disso. O pessoal aqui diz que não, mas eu não excluo a hipótese de que tenha havido alguma (inaudível). Porque você veja, é o único que deu isso. Sou um pouco suspeitoso.
Monforte - Mas não adiantou nada, né? Até cresceu...
Ricupero - Não, não tá transmitindo, né?
Técnico - Caiu a linha
Monforte - É porque isso é por linha telefônica.
Ricupero - Ah, é telefônica.
Monforte - Qual é a correção de rumo que tem que fazer?
Ricupero - É isso que nós estamos fazendo. O que você pensa que é esse compulsório, pô?
Monforte - E isso é correção de rumo?
Ricupero - É uma freada, né? Tinha sinais de aquecimento. Aquecimento em geral.
Monforte - Os juros deram uma subida de novo.
Ricupero - Estava havendo aquela suspeita... Você sabe, é um pouco preventivo. É um pouco o que o eu disse: é uma freada no ônibus para rearrumar um pouco, quando o motorista diz assim "vrum"... aí todo mundo... para distribuir melhor a coisa. Havia sinais, né? Com essa história de IPC-r, reajuste, o pessoal querendo fazer greve. Então tem que dar uma pancada, né? E eu vou dar outra. Com o negócio da importação. Isso não é bricandeira não. Eu vou fazer um troço firme.
Monforte - Não é importação de carro, é importação de tudo?
Ricupero - Tudo. Eu estou cheio de reserva, pô. Pra mim é ótimo.
Monforte - Importação de quê, principalmente?
Ricupero - Tudo.
Monforte - Vai baixar tudo? Vai liberar tudo?
Ricupero - Não, tudo eu não digo, mas em grande... Tudo quanto é bem de consumo e tal. Fazer uma coisa grande.
Monforte - Bens de consumo o que é que é? Televisão, geladeira, esse negócio todo?
Ricupero - O que você menciona, tudo. Bens de consumo duráveis. Porque é o único jeito que você tem de garantir que não vai faltar produto, porque esses caras... Porque você está jogando aí com bandidos, você entende. É tudo bandido.
Monforte - Empresário brasileiro é dose.
Ricupero - Eu não vou dizer, mas você sabe. Eu conto sempre aquela história: a gente não ameaça, mas... Você conhece aquela história da máfia? Não se ameaça... Não se ameaça... Aquilo é que bom. Uma história boa que eu contei é aquela do mexicano motorista. Você conhece?
Monforte - Não.
Ricupero - O sujeito entra num círculo na hora do 'rush' em direção contrária. O cara lá do helicóptero, que está dirigindo um programa de rádio, diz, 'cuidado, hay un loco circulando en dirección contrária'. Aí, o sujeito, ouvindo, diz assim: 'No hay solo un loco. Hay miles de locos' (risos).
Monforte - Bom, mas esse negócio do IPC-r baixando, eu acho que é importante falar.
Ricupero - Mas eu não tenho ainda. Ainda não dá. O pessoal me mata. Eu vou te prometer o seguinte: se eu conseguir convencer o pessoal aí, eu, segunda-feira... eu te dou a primazia (inaudível). Eu preciso conversar com eles, senão eles me matam. Esse pessoal tem toda aquela corporação de economista. É um troço complicado. Vão dizer: 'Pô, você proibiu da vez anterior que era ruim, agora que é bom...' No fundo é isso mesmo. Eu não tenho escrúpulos. O que é bom a gente fatura; o que é ruim, esconde.
Monforte - Uma curiosidade minha: você andou batendo no PSDB, dando umas porradinhas?
Ricupero - Depois eu parei, né? Era por causa do Franco (Gustavo Franco, diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central). Se eu não tivesse feito isso ele teria sido demitido. Toda vez que há um troço desses, para reequilibrar, porque começava vir o Tribunal Eleitoral... Não sei o quê... Para mostrar absoluta isenção eu dou um cacete nele. Foi isso que eu disse à "IstoÉ": toda vez que tiver um troço desses eu dou um cacete. Se tiver uma declaração do PMDB, eu dou um cacete no PMDB. Se for do PT... O problema é que meus assessores são todos do PSDB. Tinha que ter alguém do PMDB aí. Eu tinha que fazer isso, viu Carlos. Porque, se não, ficam questionando a minha isenção. Eu não podia... Agora acalmou, né? Você viu, acalmou e tal. Ninguém mais falou no assunto. Essas coisas você tem que matar na hora. A única forma que eu posso provar o meu distancianciamento do PSDB é criticar o PSDB.

Monforte - ...isso vai ser gravado em São Paulo... Nós estamos com o 'link' aberto... Porque entrou ao vivo... Nós estamos com o 'link' aberto. Daí, já grava direto. O problema é esse aqui (apontando com mão direita para o ponto eletrônico que usa no ouvido). Esse negócio da gasolina não é um pouco precipitado, não? Falar que pode baixar o preço e tal?
Ricupero - Isso eu falei para criar um pouco... Você sabe, está todo mundo falando do IPC-r aí...
Monforte - (interrompe Ricupero para conversar com a técnica sobre a qualidade do som)
Ricupero - (retomando a resposta sobre gasolina) Como eu estava te dizendo, com esse negócio afasta um pouco o clima de (inaudível). Eu faço essas coisas um pouco por instinto, sabe? De vez em quando armo uma confusão. Não tenha dúvida: esse país não é racional.
Monforte - Nem um pouco.
Ricupero - Dou um susto na Petrobrás... Aproveito para dar a eles firmeza para enfrentar reivindicação... Tem várias vantagens. Eu até gostaria de fazer. Se eu puder, eu faço.
Monforte - Na hora de responder, também responde curtinho como no 'Jornal Nacional' para a gente perguntar mais, né? Está ficando bom nisso, heim?
Ricupero - Estou. Depois a gente faz um programa junto quando eu sair do governo. Um programa de debate (risos).
Monforte - (volta a conversar com a técnica, tentando resolver o problema de áudio).
Ricupero - Se quiser, nesse fim-de-semana podia ver o negócio do 'Fantástico'. Posso gravar também, se quiser alguma coisa, eu estou à disposição. Quem é que é? É o Alexandre?
Monforte - Não. O 'Fantástico' é a Nereide que cuida mais disso. Eu posso até falar com ela.
Riucpero - Pode falar, porque eu estou disponível. Eu vou ficar aqui o fim-de-semana inteiro. Porque eu acho bom. Porque nessa fase, meu caro, por causa do IPC-r, eu estou querendo, por isso é que eu resolvi ficar no ar o tempo todo. Então, o máximo que eu puder falar, eu falo.
(a transmissão fica fora do ar durante 12 segundos e aparece na tela a inscrição 'Geração TV Globo Brasília')
Ricupero - ...Ele me telefonou outro dia. Queria me felicitar por causa do pronunciamento. Eu não estou preocupado com isso.
Monforte - E é Roma mesmo?
Ricupero - Para mim seria melhor, porque assim eu descanso e tal. Olha, muito entre nós, vai parecer presunçoso, o governo precisa muito mais de mim do que eu dele.
Monforte - Hoje, não tenho a menor dúvida.
Ricupero -Isso eu não diria para outra pessoa... Quando terminar tudo, se tudo der certo, o problema vai ser ele (FHC) explicar não me convidar.
Monforte - O quê?
Ricupero - Vai ser explicar não me convidar (risos). Você sabe, eu não digo isso, mas há inúmeras pessoas que me escrevem e que me procuram para dizer que votam nele (Fernando Henrique Cardoso) por causa minha. Aliás, ele sabe disso, né? Que o grande eleitor dele hoje sou eu. Por exemplo, para a Rede Globo foi um achado. Porque ela em vez de terem que dar apoio ostensivo a ele botam a mim no ar e ninguém pode dizer nada. Agora, o PT está começando... Mas não pode. Porque eu estou o tempo todo no ar e ninguém pode dizer nada. Não é verdade? Isso não ocorreu da outra vez. Essa é uma solução, digamos, indireta, né?
Monforte - Eu não tenho a menor dúvida que muita gente vai votar nele por (inaudível).
Ricupero - Eu ouço muita gente que não votaria nele por causa do PFL e que vai votar por causa de mim.
Monforte - (interrompe a conversa novamente para discutir problemas técnicos)
Técnico - Está indo via satélite, tá? Qualquer coisa que tiver falando aí, antena parabólica pega.
Monforte - Tudo bem. Está cheio de ruído. Está ouvindo isso?
Técnico - Está, todo mundo ouve.
Ricupero - Então, já pegaram.
(Monforte e Ricupero se olham e riem. Monforte recebe ligação em um telefone celular)
Monforte - Oi, Fala? Diga? Tá, tudo bem. Já estamos sabendo aqui. Então, tá, tchau (em seguida, dirige-se a Ricupero). Olha, é para não falar mais não porque está pegando toda a conversa na parabólica.
Ricupero - Deveriam ter avisado antes...

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