São Paulo, sábado, 3 de setembro de 1994
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Política de recursos humanos administração pública

SÉRGIO CUTOLO DOS SANTOS

A profundidade dos problemas sociais, aliada às dificuldades crescentes de financiamento do setor público, vem ampliando o consenso sobre a premência de se reformular o Estado, buscando maximizar a opção alocativa de seus recursos. Neste sentido, tão importante quanto priorizar os serviços voltados ao atendimento das necessidades básicas da população é a permanente busca da eficiência e da eficácia na prestação de tais serviços.
Dessa perspectiva, assume papel de relevo e urgência a adoção de uma política de recursos humanos baseada na racionalidade econômica e administrativa.
De uma forma geral, o cidadão que procura os serviços públicos essenciais não pode imaginar, pela baixa qualidade dos mesmos, que de 1980 para cá as despesas de pessoal nas administrações públicas cresceram mais de 50%, em termos de participação no PIB, e o número de funcionários mais que duplicou.
O prefil ocupacional nas atividades típicas de governo, onde predominam as ocupações administrativo-burocráticas que concentram quase 60% dos empregos, também não sugere nenhuma correspondência com as reais necessidades de atendimento.
Afora esses fatores, os níveis de dispersão salarial e o acúmulo de passivos trabalhistas, no âmbito do setor público, revelam que as sistemáticas utilizadas para a concessão de vantagens remuneratórias podem ser, no mínimo, questionadas do ponto de vista da racionalidade administrativa.
Uma das discrepâncias mais óbvias, pode ser constatada pelas diferenças dos rendimentos médios nos três Poderes da União. O rendimento médio dos servidores do Poder Executivo é quase duas vezes inferior ao praticado pelo Poder Legislativo e 57% inferior ao observado no Poder Judiciário Federal.
A comparação da estrutura salarial da administração pública federal com a que prevalece na iniciativa privada aponta para duas outras sérias distorções.
A primeira, que poderia até ser justificada não fosse a baixa qualidade dos serviços prestados, diz respeito aos maiores níveis de remuneração praticados no setor público. Os servidores da União ganham, em média, dez salários mínimos, enquanto os trabalhadores vinculados aos setores mais modernos da iniciativa privada percebem, também em média, cinco salários mínimos.
A segunda refere-se a inversão da pirâmide remuneratória no caso da administração pública, contrariando as práticas usuais de política de recursos humanos. O plano de cargos, que detém o maior número de servidores na administração pública federal, registra que 63,7% dos funcionários estão concentrados nos maiores níveis de vencimento, 25,3% nos médios, enquanto a base da pirâmide absorve apenas 11% do total.
A dispersão salarial existente entre os Poderes, bem como no interior de cada um deles, e a discrepância de sua estrutura salarial em relação à iniciativa privada são expressões concretas de que as regras que tiveram por objetivo limitar as concessões salariais nas atividades típicas de governo foram contornadas por segmentos específicos da burocracia estatal.
Promoções e criação de gratificações, verbas de representação e outras vantagens remuneratórias asseguram privilégios a algumas categorias, especialmente àquelas com maior proximidade do Poder e/ou autonomia administrativa.
Em síntese, o comportamento do mercado de trabalho na administração pública no período recente indica que o emprego, a remuneração e as condições de trabalho no aparato estatal não tiveram como mais importantes condicionantes os aspectos relacionados com a instância econômica ou com as necessidades de atendimento.
Procurando gear as pré-condições para uma política de RH mais profissionalizada, a Previdência Social desenvolveu, e vem acompanhando desde o início de 1993, uma série de indicadores de desempenho operacional que servem, dentre outras coisas, para medir a produtividade dos servidores, bem como dos serviços. Da análise dos mesmos pode-se verificar a grande discrepância de desempenho existente no setor público.
A imagem das longas filas e de espera no atendimento, associada normalmente aos serviços essenciais, não condiz com a realidade de hoje de centena de postos do INSS onde o tempo de espera é mínimo e a demora de todo o processo de concessão de um benefício não ultrapassa, em média, 15 dias.
No entanto, o fato de ainda existirem postos com grande número de pessoas aguardando o atendimento e esperando cerca de 200 dias para obter um benefício, acaba por comprometer todo o trabalho da instituição.
Um exemplo dessa discrepância de desempenho pode ser constatado quando se compara o número total de servidores lotados nas gerências do seguro social com a produtividade média. Há uma relação inversa da produtividade média, calculada pela carga de trabalho, e o número total de servidores lotados em dez gerências do seguro social nos Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, ou seja, quanto maior o número de servidores pior a sua produtividade média e vice-versa quanto menor o número de servidores maior a produtividade.
É na produtividade individual do servidor, contudo, onde observam-se as maiores distorções. Não obstante à homogeneização das remunerações, convivem atualmente funcionários cujo desempenho difere em até 50 para 1. Concretamente, coexistem servidores previdenciários cuja a produtividade individual é 50 vezes maior do que a de seus pares, cujas remunerações são idênticas.
Essa situação, que se antagoniza aos interesses legítimos da comunidade, decorre de imposições legais e constitucionais.
Na verdade, a responsabilidade do gestor público é ainda maior, pois o objetivo é o bem comum e é sua tarefa impedir que o domínio e o proveito da coisa pública sejam privativas de qualquer segmento específico da sociedade.

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