São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 1994
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Orquestras vivem situação de penúria

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

A maioria das 37 orquestras do Brasil se decompõe. Os salários são minguados e a infra-estrutura, insuficiente. O resultado artístico está abaixo dos padrões internacionais de qualidade.
Públicas ou privadas, profissionais ou semiprofissionais, elas padecem de ineficiência. Trabalham muito, produzem pouco e pesam no orçamento de seus mantenedores. Greves, paralisações e "operações-tartarugas" figuram em suas partituras.
É uma situação crônica, a que músicos, poder público, mecenas e a sociedade se acostumaram.
"Falta formação", diz o maestro Jamil Maluf, da Orquestra Experimental de Repertório, que divide um salão no centro de São Paulo com a Polícia Militar. "Temo pelo futuro musical do Brasil."
Não há número suficiente de instrumentistas de qualidade para preencher o efetivo orquestral e dar conta do repertório sinfônico.
"Aqueles que fundam as orquestras nunca se perguntam de onde vão tirar os músicos", diz o maestro Olivier Toni, do Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes da USP. "Não há rigor na seleção de instrumentistas. Os maestros se preocupam mais em se promover pessoalmente junto aos governantes do que com a qualidade. Assim, não podem existir orquestras no Brasil".
O maestro Lutero Rodrigues, da Orquestra de Câmara de Curitiba, fez em 1993 um levantamento das orquestras brasileiras. Chegou ao número de 37 grupos e à conclusão que não há uma única orquestra de qualidade internacional no país.
Ele aponta alguns problemas. Os músicos se profissionalizam muito cedo. Lutam pela sobrevivência. Fazem "bicos" para complementar o orçamento. O salário médio de um músico no Brasil é de R$ 600,00 mensais. Além de ganhar mal, não têm tempo para se aperfeiçoar. Preocupam-se mais com o ganho do que com o progresso das artes.
O mais bem pago maestro de São Paulo, Eleazar de Carvalho, 81, ganha um salário mensal de R$ 2,6 mil da Secretaria de Estado da Cultura. Um iniciante de orquestra alemã começa carreira ganhando cerca de US$ 3,5 mil mensais.
Os Estados e municípios são os principais responsáveis pela penúria das orquestras profissionais no país. Não desenvolvem políticas salarial e cultural. Preferem tratar os músicos como barnabés rebeldes e fazer das orquestras instrumentos de promoção política.
Integram esse grupo as orquestras do Estado de São Paulo (Osesp), Jazz Sinfônica, do Estado do Paraná (Osinpa), de Porto Alegre (Ospa), de Campinas, do Teatro Municipal de São Paulo e do Teatro Nacional de Brasília.
Formam a elite musical do Brasil. Quase todas, porém, passam por problemas como falta de partituras, instrumentos e locais adequados para ensaios.
As poucas orquestras privadas –a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB), do Rio de Janeiro, a Orquestra de Câmara de Blumenau (SC) e a Orquestra de Câmara Villa-Lobos– sobrevivem com a venda de projetos específicos, que não permitem um planejamento a longo prazo ou a consolidação junto ao público. Podem parar de uma hora para outra, como aconteceu com a OSB em 1992, quando foi descapitalizada em 70% e teve de estender o chapéu ao governo. Elas também não têm material ou compensação artística.
"A estrutura está carcomida", diz o maestro Benito Juarez, da Sinfônica de Campinas.
"A decomposição é visível", afirma o maestro Isaac Karabtchevsky, diretor artístico da OSB e do Teatro Municipal de São Paulo. "As orquestras se habituaram a passar por períodos críticos, dos quais ninguém escapa neste país, a não ser os banqueiros".
Os dois acham que a solução está em transformar as orquestras em fundações de direito público autônomas e abertas para parcerias com a iniciativa privada. "Precisamos criar condições de mercado, sem que o governo ignore seu papel cultural", diz Karabtchevsky.

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